Essas
provavelmente são as duas palavras mais assustadoras que
uma pessoa pode ouvir. Por que você “precisa”
falar comigo? Em vês de só conversar, livre e arbitrariamente? O que foi que eu
fiz? Já estava assim quando eu cheguei! Você deve ter entendido errado... Não
foi aquilo que eu quis dizer. Ou foi, não sei. Mas talvez eu tenha dito com a
entonação errada. É isso; você não me ouviu direito! Ou eu disse errado... Ou
eu fiz errado? Ou eu não fiz nada, e você esperava que eu tivesse feito... O
que você quer afinal? Me diga agora! Não deixe para depois o castigo que você
quer me dar agora. Por que tem que ser pessoalmente? Por que algo tem que ser
dito afinal?! Eu achei que estava tudo bem... O que está acontecendo?!
O que aconteceu foi que as pessoas não conversam mais. Vide a
necessidade de pedir a você que tiremos um tempo das nossas vidas ocupadas,
nossos compromissos inadiáveis e das nossas outras mil pessoas em nossas vidas,
para falar sobre nós e como estamos. E, principalmente, sobre o que vamos
fazer. Porque não está tudo bem. Nós podemos continuar fingindo que está, e
empurrar com a barriga até aonde der, mas e aí? Tudo tem limite. Inclusive nós.
E quando passarmos dele não me diga que eu não tentei.
O silêncio grita. As palavras não ditas sufocam. E as decepções que se
mantém escondidas atrás de um sorriso amarelo e torto podem ser o gatilho
definitivo para o fim de qualquer relacionamento, amizade ou ligação entre duas
pessoas que se importam muito uma com a outra. Até alguém fazer algo que o
outro não gostou. Só que em vês do outro dizer que não gostou, ele guardou para
si. Talvez porque quis se convencer de que aquilo não teve importância. Ou de
que aquilo não machucou. Ou de que você não quis dizer aquilo. E aí acabamos
conversando com nós mesmos para evitar admitir que precisamos conversar um com
o outro. Porque eu, comigo mesmo, me entendo bem. Mesmo quando pareço estar
perdido, eu me entendo. Assustador mesmo é o outro. No que você poderia estar
pensando...?
Pior mesmo é quando eu e você não só evitamos de nos falar, mas trazemos
reféns inocentes ao nosso eixo do mal-entendido. E repetimos a história tantas
vezes que acabamos por decidir que conversar não adianta. Porque se você
realmente se importasse, não teria dito o que dito. Porque Fulano entendeu o
que eu senti, enquanto você não percebeu nada. Esse é o problema dos
relacionamentos atuais: às vezes quando você pensa que não disse nada, o outro
faz do seu nada o universo. E não só é capaz de se perder nele, mas se fere
cada vez mais a medida que insiste em não avisar a você que aquilo doeu. Ou que
você não parece mais o mesmo. Que você sumiu. Que eu sinto a sua falta. Que nós
precisamos nos ver. E que tudo isso só vai ser possível se a gente sentar,
olhar nos olhos um do outro e dizer tudo o que queremos dizer. Tudo o que
precisamos dizer.
Quanto a mim, ultimamente eu tenho dado crédito instantâneo a qualquer
um que se disponha a me dar atenção. Não é questão de auto-estima baixa,
carência ou transtorno bipolar. Mas se tem uma coisa que o tempo me ensinou é
que não só os amigos de verdade são muito mais significativos do que as
companhias abstratas de balada que nós arrumamos por aí, como a reciprocidade
que eu venho recebendo deles é muito mais importante do que qualquer foto em
conjunto que participei na festa durante o último final de semana. Eu gosto das
pessoas. Especialmente, das minhas pessoas. Gosto de conversar com elas, de
saber como foi o seu dia e de como você está. Se tiver algo que eu possa fazer,
me diga. E se tiver algo que está me incomodando, nada mais justo do que eu
avisar a você de que não, não está tudo bem.
Não é a toa que fazemos manutenções preventivas em aparelhos e máquinas
para impedir que elevadores despenquem do ar, ou para limpar nossos discos
rígidos de vírus que os impedem de funcionar direito. Mas e quanto a impedir
que nossos relacionamentos atrofiem? O que aconteceu com o tempo em que nós
conversávamos só por conversar. Quando estávamos contentes só por estarmos
juntos. Quando não precisávamos de nada a mais um do outro, porque estávamos em
tamanha sincronia que você sempre era capaz de perceber que eu estava
precisando de um abraço, ou de uma palavra amiga. Às vezes só precisava de um
conselho ou, quem sabe, uma direção. E na grande maioria das vezes, eu
simplesmente precisava de que você estivesse aqui. Ou de que você me procurasse
de vez em quando também.
Para mim, mais assustador do que ouvir alguém dizer que precisa falar
comigo, é quando alguém com quem eu conversava muito já não parece mais tão
ansiosa para que troquemos palavras. E cá entre nós, ultimamente eu venho
aprendendo cada vez mais que não existem pessoas importantes na vida com as
quais é preciso conversar, porque elas geralmente costumam estar sempre por
perto.
Mas ainda há aquelas que decidem falar tarde demais.
*Escrito em
02/09/2013.