segunda-feira, 14 de março de 2016

A merda no ventilador


*Escrito em 02 de Julho de 2014.

De todas as dificuldades, talvez o nosso medo de viver seja a mais difícil de superar. Afinal, a vida é o que acontece enquanto você tenta compor um plano B, e o que poderia ser mais assustador do que acabar sendo o arquiteto  acidental do seu próprio desastre? E de se tornar o encarregado pela obra de reconstruir tudo de novo? Mas é isso que a gente faz, dia após dia, quando sai de casa para trabalhar, ou para estudar, ou para tentar fazer qualquer coisa na verdade. E se daqui em diante nada mais do que eu disser fizer sentido, que sejam lembradas apenas essas duas palavras: “talvez” e “tentar”.

Somos seres humanos complicados, complexados, neuróticos e atarefados cuja única certeza na vida é de que todos esses dias curtos, esse frio intenso, e essa procrastinação para lavar a louça na pia vão acabar mais cedo ou mais tarde. E aí vivemos com um “talvez” na base de todas as coisas, e um “tentar” que só vai depender da gente para sustentá-las. Talvez eu seja bem sucedido quando esta faculdade acabar, mas pra isso eu vou ter que tentar encontrar outro caminho para seguir. Talvez eu consiga um emprego que eu ame, mas para isso eu preciso tentar bater em todas as portas que eu puder até que uma se abra e me deixe satisfaça com o que eu encontrar. Talvez eu descubra o amor em você, mas para isso eu preciso tentar deixar você fazer parte de mim.

Agora que um bom tempo já se passou, como um quebra-cabeças cuja imagem finalmente começa a fazer sentido, eu acho que entendo um pouco do porquê de tantas coisas terem acontecido. E apesar da sensação de que tem sido um fim do mundo após o outro, é assim que se descobre o que realmente é ser resiliente e, de quebra, o que você realmente precisa ao contrário do que você acha que quer. E este tem sido um grande problema para mim: desde a concepção ilusória que eu tinha da vida que eu achava que deveria ter, até a realidade aparentemente ingrata em que eu vivo. Completa com a sua coleção de limitações e incoerências. Parece uma bobagem bem fácil de aprender, caso não fosse tão irônica. Mas às vezes por mais que a resposta para o presente esteja na ponta do seu nariz, você nunca irá enxergá-la se continuar forçando suas vistas para tentar enxergar o futuro. Felizmente ou infelizmente, tenho um currículo rico em experiência com ironias.
Você precisa conhecer pessoas ruins, lugares chatos e coisas infames, para saber reconhecer amigos insubstituíveis, lugares inesquecíveis e coisas raras. Você precisa passar pela chuva para ver o arco-íris. Você precisa passar pelo ruim para saber sentir o que é bom. E às vezes na vida, você precisa deixar a merda atingir o ventilador e acabar com tudo ao seu redor, para descobrir o que realmente é importante nesta vida, e o que você realmente precisa nela. É assim que prioridades mudam, as companhias vazias se perdem, os cenários se tornam mais seletos, e a gente percebe que por mais que ainda reflita a mesma cara no espelho, nós definitivamente não somos mais como antes. A gente se destrói para se recompor, porque é isso que a vida exige de nós. Talvez uma pessoa que sai de casa sem ter um plano B guardado no bolso tenha mais chances de se perder do que alguém que dá dois passos para trás antes de tentar seguir em frente de novo. E foi aí que eu finalmente comecei a entender o porquê da surra que a vida estava me dando.

Só que tudo isso começa com o medo que a gente tem de quem se é e da vida que a gente tem. Das limitações que nos cercam, e de que nem sempre todas as possibilidades do mundo estarão ao nosso alcance. Que nós só temos dois braços que são pequenos demais para abraçar o mundo, mas que são perfeitamente aconchegantes para acolher outra pessoa que nos aceite. O medo atrofia a vida, impede o crescimento, e pode até anular um coração quando este não está disposto a sentir um pouco de frio antes da primavera. Porque uma hora dessas a merda vai atingir o ventilador, e vai fazer parecer que a vida não tem mais jeito. E aí você pode escolher entre sentar no meio-fio da calçada e chorar, ou aceitar que as coisas talvez não estejam do jeito que você queria, mas que nada te impede de tentar algo diferente.

Aí você me pergunta se eu quero tentar. Talvez eu não tenha a resposta que você esperava ouvir, mas o que eu te digo é isso: sim, eu quero. Talvez eu não seja o cara que você quer, mas eu quero tentar provar que posso ser o que você precisa. Tudo o que você precisa fazer é jogar o seu medo fora e segurar a minha mão. Se a vida nos falhar, e der merda por todos os lados, eu te ajudo a limpar. Eu não tenho muito o que chamar de vida, mas o pouco que eu vi me permite dizer que nada do que aconteceu foi o fim do mundo. E talvez as coisas fiquem um pouco mais fáceis se a gente tentar seguir em frente juntos.

Eu também tenho medo de tentar, mas talvez a gente consiga.