Talvez seja porque eu peguei
essa mania do meu pai, que tem o espírito de administrador desde que eu o
conheço por gente e não só por progenitor. Eu me lembro bem daqueles rituais
burocráticos a cada fim de mês, pouco antes de fechar a loja e apagar todas as
luzes, quando ele se colocava a postos para imprimir bobinas inteiras de
relatórios antes de conceder aquele determinado mês encerrado, e para dar início
a um novo período de vendas. E eu me lembro de sofrer, lentamente e
dolorosamente, durante esse ritual. Porque nunca realmente parei para pensar no
porquê de todo aquele cuidado ou daqueles relatórios. Até que eventualmente, ao
longo de um novo mês, ele dava um jeito de me contar que estávamos crescendo. Em
porcentual, é claro. Porque a curva de evolução da minha maturidade emocional sempre
parecerá equivalente aos batimentos cardíacos de um sujeito em coma: constante,
porém arrítmico.
E é sobre isso
que eu estava pensando hoje. Sobre como aquele nosso ritual a cada fim de mês
já não existe mais, mas que isso não necessariamente me impede de tirar um
extrato mental do crescimento em percentual que a minha vida tem demonstrado.
Porque exatamente um ano atrás, eu estava reclamando sobre o quanto eu não
havia planejando a minha vida até o dia seguinte à minha formatura. Eu
simplesmente não sabia o que iria acontecer ou o que seria de mim, e o quanto
eu senti mais frustração por mim mesmo do que medo pelo futuro. Eu deveria ter
alguma carta escondida na manga... Ou algum plano B... Não deveria?
Meu pai
provavelmente teria. O que só acrescenta ironia às minhas estatísticas.
***
Pensando
sobre os altos e baixos que eu já tive neste ano que eu mal conheço, mas já
considero “pacas”, eu percebo o
quanto fazer planos é invariavelmente infame. Do que adiantou construir
castelos em sonhos, se eles acabaram mudando de endereço? De que serviu
imaginar o que eu faria em determinadas situações, se eu me pego agindo mais
maleável a mudanças do que eu sequer considerei que seria capaz um dia? Talvez
esse seja o segredo das vendas, bem como o da vida em si: pare de imaginar que
as coisas serão do jeito que você imaginou que elas seriam.
Porque os
relatórios do meu pai, embora feitos de maneira minuciosa, sempre continham
suas sequelas de estornos e margens de erro. E com a minha vida não tem sido
diferente.
Tudo o que o
meu pai queria era estudar aqueles relatórios e descobrir que as coisas estavam
melhorando. Que a sua procura por estabilidade estava cada vez mais perto de
acabar, para que ele finalmente pudesse relaxar e deixar de lado seus percentuais
de vendas e sua calculadora científica que, por sinal, eu jamais aprendi como
funciona. Mas não foi assim que a nossa vida se desenrolou. Pelo contrário;
talvez a nossa felicidade estivesse escondida nas pequenas anotações de rodapé
de todos aqueles extratos. Porque nem a loja nem os relatórios mensais existem
mais, mas nós continuamos aqui. Vivendo, aprendendo, crescendo e multiplicando
nossos ganhos.
E então eu
percebi que a minha procura por estabilidade ainda não está nem sequer perto de
terminar, e o quanto isso é algo realmente bom. Porque eu nunca precisei
depender de relatórios para saber o quanto eu estava crescendo, e o quanto a
minha felicidade sinceramente depende das margens de erro das escolhas que eu
faço. Foi assim que eu cheguei até aqui. E é assim que eu sigo em frente.
Minha
economia pessoal só pode começar a mudar se eu projetar um futuro melhor. É pra
isto que servem esses relatórios literários aqui.