Alguém me quebrou. E um dos
motivos pelos quais eu ando evitando escrever, também serve para explicar
porque eu ando evitando sentir certas coisas. E como escrever invariavelmente
envolve enfiar uma faca no coração e torcer até que as palavras que vazem dele
formem algum sentido, eu tenho tomado um pouco mais de cuidado mediante os meus
passatempos masoquistas ortográficos. Porque, pior do que admitir que alguém me
quebrou, seria sentar e escrever sobre isso. Mas já é fim de mais um mês e nada
de novo surgiu ainda, assim como sumiram as expectativas de que isso dissipe
sem que se faça necessária alguma cerimônia. Então por que não criar um pouco
de adrenalina para mim mesmo para pensar e sentir sobre você?
Particularmente,
eu gosto de escrever para você. “Você”,
que pode ser qualquer uma que vaga aleatoriamente pela órbita das minhas
neuroses. “Você” que, apesar de ter
um nome de verdade e, suspeito, um coração de mentira, ainda é capaz de causar
um pouco de calafrios só de lembrar que esta reação é diretamente proporcional
à alegria ansiosa que eu tinha por me permitir atribuir sentimentos ao seu nome
de verdade e seu coração sincero, até então. “Você”, cuja lembrança terrivelmente agridoce, atemporal e absurda
ainda me serve de inspiração para desviar dos instintos de desistência e desolação
de um Domingo à noite. “Você”, que eu
não pretendo relevar o nome próprio que possui, mas que secretamente tira um
tempo da sua rotina deslumbrante para passar os olhos em minhas palavras para
saciar seu apetite constante por uma plateia. Acontece que desta vez eu não
estou falando de nenhum desastre em particular, mas de um padrão crescente em
proporções geométricas de desilusão.
Não foi
alguém em específico quem me quebrou. Desde quando consigo me lembrar, não
houve apenas uma mulher que passou por mim como um tsunami e deixou para trás
uma devastação por completo. Pelo contrário, cada uma delas foi como uma peça
de dominó postas em uma sequencia perfeita, até um descuido fazer com que a
cadeia inteira despencasse sobre mim. E a partir disso surgiram comportamentos
padrões, gostos específicos e trilhas sonoras que, ao serem alinhados em um
círculo vicioso, sempre acabavam da mesma maneira: comigo, decepcionado, recolhendo
as peças caídas no chão.
Eu ando tão
focado em manter uma das peças de pé que sempre acabo me surpreendendo quando
ela acidentalmente cai. E, claro, consequentemente derruba todas as outras em
seu alcance. Mas isso só acontece porque, em se tratando de relacionamentos, eu
ainda continuo procurando as peças certas para serem colocadas nos lugares
certos, na forma da garota certa (que não existe) e do modo certo como
deveríamos nos conhecer (que também não existe). E por mais que essa sequencia
não se firme de pé, eu persisto. Isto é, até o dia em que eu desisti de
recolher as peças e abandonei o jogo.
E a partir
do momento em que eu me percebo gostando de alguém, os padrões se repetem
perfeitamente. Como quem posiciona as peças tortas de dominó de pé somente para
que se derrubem novamente, porque gosta da previsibilidade do desastre. Ao
menos é algo no qual se pode confiar. Eu gosto de você, mas não sei como
demonstrar isso. Guardo para mim, porque sinceramente acredito que você não
deve sentir o mesmo. Até que um dia você finalmente descobre; talvez porque eu
criei coragem para te dizer, ou porque o som das peças tortas sendo derrubadas
chamou a sua atenção. E você me diz que já tem outra pessoa, ou que não há
química entre nós, ou que eu simplesmente não sou a peça que falta na sua
própria sequencia. E quando os dominós desabam, eu apenas as empurro para fora
da minha vista e procuro outro jogo para me distrair. Nunca considerando a
possibilidade de que talvez eu esteja posicionando as peças erradas. Ou que
cadeias de dominós em pé mais cedo ou mais tarde surtirão seu efeito ao ruírem
em colapso. A gravidade envolvida nunca falha.
O segredo
não está em rearranjar as peças, ou nos espaçamentos entre elas. Em outras
palavras, não adianta esperar resultados novos ao continuar tentando encaixar
relacionamentos em padrões fracassados. Coisas como esperar para ver quem fala
ou liga primeiro. Ou resistir para não admitir que está atraído por ela, por
medo de que tudo o que vocês já construíram não resista à queda. Ou apenas
tropeçar e destruir sequencias de sentimentos por receio de que vocês não se encaixem
como deveriam. É isso que nos deixa ansiosos por ver as peças tremerem, e nos
faz parecer incapazes de tentar reconstruir algo com alguém. E, definitivamente,
não existem as peças certas ou os lugares certos. Assim como não existem as
pessoas certas e as sequencias certas em que devem se colocar para não
desabarem.
No fim,
somos todos incertos e frágeis como peças de dominó postas de pé uma ao lado da
outra. Sempre haverá o risco de que um gesto em falso venha a afetar outras
peças, outras pessoas e outras estratégias por perto. E quando padrões de
sequencia simplesmente não resistem, apesar de toda a esperança e persistência
do mundo, o melhor a fazer é procurar outra maneira de manter nossas peças de
pé, e os nossos relacionamentos, estáveis. Talvez ninguém tenha me quebrado ao
ponto de me convencer a desistir do jogo; talvez eu só tenha perdido o
equilíbrio e esteja com receio de tentar de novo. Minhas mãos tremem só de pensar
em tentar colocar duas peças de pé em sequencia, ou de tentar segurar a sua mão
quando andamos lado a lado. Mas são pequenos jogos que insistimos em
participar, visto que o prêmio em consideração parece atraente demais para se
abandonar. É isto, ou passar o Domingo à noite cercado de peças espalhadas pelo
chão e ninguém para me ajudar a colocá-las em pé novamente. E não é algo que eu
espero que “você” entenda. A vida é
muito curta, e eu certamente não quero passá-la tentando colocar peças tortas de
pé em vão e escrevendo seu nome entre aspas.
E foi assim
que eu silenciosamente quebrei meu padrão.
*Escrito
em 21/09/2014