quinta-feira, 28 de abril de 2016

Na saúde e na doença

Febre, coriza, dores no corpo. O ciclo vicioso da gripe me pegou de novo, o que era mesmo uma questão de tempo. Felizmente, esta não é a primeira vez que o oeste do Paraná se afunda nas temperaturas próximas a zero e me pega de surpresa. Por isso já deixei cinquenta tons de antibióticos e anti-inflamatórios ao meu dispor. Deixaria as coisas mais fáceis a medida em que o meu corpo finalmente começasse a falhar e só o que me restasse fossem tentar esquentar um último copo de leite quente e procurar erros ortográficos na carta de despedida que eu deixaria estrategicamente em meu criado mudo. Para quando minha guerra contra a influenza finalmente chegasse ao fim – ou, ao meu fim, pra ser mais exato.

Ok, eu posso estar exagerando, mas o enjoo é real e meu rosto acabado não me deixa negar: olheiras assustadoramente lívidas obtidas através de noites mal-dormidas acompanhadas de tosse seca e delírios durante a madrugada agora mascaram a minha face, enquanto a vontade de viver se esvazia de mim lentamente conforme o vírus toma conta de mim ao me atirar ferozmente na minha cama do jeito menos divertido possível.

Só que apesar do mal-estar, náusea, tontura e catarro que agora compõe a minha personalidade previamente aconchegante, eu não vejo estar tomando mais remédios por dia do que a minha avó de 77 anos como o pior de tudo. Como era de se esperar, foi um dos efeitos colaterais que me deixou ainda mais abatido: perder o controle da saúde do meu corpo, e todos os benefícios que provém disso.

A verdade é que eu gosto de ter controle, por mais que eu me sinta aliviado por não ter tantas responsabilidades às vezes. Porque eu sei, bem no fundo, que se eu tomasse a direção dos deveres que me cercam, nada que qualquer outra pessoa fizesse seria bom o bastante para mim. Eu provavelmente acabaria rejeitando de cara qualquer opinião ou tentativa de colaboração para aprovar somente as minhas ideias, ou revisaria qualquer trabalho cooperativo sob a alegação de que isto não é bom o bastante, e que eu posso fazer melhor.

Este é só um dos motivos pelo qual eu não sou um bom paciente, e de certa forma foi bom descobrir isso. Foi bom perceber exatamente o quanto eu gosto de ser um agente ativo nesta vida, capaz de realizar grandes feitos não só independentemente mas também através de trabalhos grupais – desde que esteja sob minha direção, é claro. Tudo isso pode parecer fragmentos de um insight deliciosamente milagroso, o que significa que algum dos comprimidos está finalmente fazendo efeito e eu estou prestes a deixar de me sentir um desperdício de massa humana para voltar à ativa e tomar o controle da minha vida de novo. Ou, claro, eu posso estar apenas delirando e talvez seja melhor ignorar tudo o que eu estou dizendo aqui.

Eu gosto de ter controle sobre as coisas. É uma habilidade que eu simplesmente tive que desenvolver depois de morar sozinho por muito tempo, e ter sido forçado a aprender a cuidar de mim mesmo, na saúde e na doença, enquanto não havia ninguém mais por perto. Eu precisei ter remédios à mão e aprender a saber o que fazer em situações de emergência, porque há anos atrás, quando saí de casa para morar sozinho e fui pego de surpresa pela primeira vez pela temperatura negativa, eu não tinha para quem ligar. Talvez em vez de explorar meu delírio febril, eu deveria agradecer pelos votos de melhoras que meus amigos me desejaram hoje e simplesmente deitar a cabeça no travesseiro e descansar com otimismo, porque o fim de semana me chama. Mas tudo bem. Só por hoje eu vou baixar a guarda a admitir que eu preciso relaxar enquanto os antibióticos tomam meu controle para variar um pouco.

As palavras começaram a dançar na minha frente e o quarto está girando. Melhor eu voltar para a cama. Sem drama, nada de pânico. Diga a minha mãe que eu a amo.

*Escrito em 25/07/2013, mas os efeitos da gripe continuam os mesmos.