O problema na verdade é bem
simples, e nunca teve nada a ver com a louça suja acumulada na pia. O problema
vai bem além disso – especialmente de você. O problema sou eu, quem na verdade
nunca quis ter muito a ver com... Bom. Nada.
É isso. E
foi assim que trinta linhas foram poupadas de serem escritas para lamentações,
lamúrias e lentes de aumento de quem lê e 1) se identifica ou; 2) se acha o
motivo pelo qual eu me coloco em frente a uma traumatizante folha em branco do
Word para escrever e, quem sabe, encontrar algum conforto em discorrer sobre o
quanto você consegue interferir sobre o meu humor, mas que quem é solenemente,
inteiramente e apocalipticamente responsável pelas minhas olheiras e os meus
suspiros cansados sou eu mesmo.
O que, por
acaso, nos leva a mais trinta linhas sobre isso.
Mas voltando à louça suja (que nada tem a ver com louça suja).
Quem me conhece já sabe que eu sou assim; cheio de metáforas egocêntricas
capazes de partir de qualquer coisa que esteja ao meu alcance – e de teorias
mais-ou-menos (leia-se: mais pra menos)
fundamentadas sobre elas. E aqui e agora, meus amigos, é claro que a louça suja
significa mais do que apenas pratos e copos da noite anterior, somados a
canecas e colheres do café da manhã de hoje: é o universo.
Ok. Longe demais, eu sei. Então digamos que não é o universo. É
apenas... O mundo. Meu mundo. Um mundo cheio de coisas que eu imaginei que
durariam para sempre. E aqui são necessárias duas explicações: 1) apesar do meu
repúdio pelo uso do termo “coisa” (que, até hoje, carrego
comigo a lição que minha professora de português da oitava série nos passou
sobre o uso deste termo significar uma trágica ausência de vocabulário) e 2)
apesar de todos os momentos definitivos que marcam a passagem da vida juvenil
para a odisseia adulta, eu aprendi a aprender que nada dura para sempre. E digo
isso porque a aprendizagem de algumas coisas também precisa ser aprendida (e
uso “coisas”
aqui para subentender mais do que este parágrafo poderia conter).
E dentre muitas as “coisas” que aprendi ao longo da
pequena passagem que já percorri por aí, sempre foi chamada a minha atenção
para o uso de outro termo fatídico: o nada. Porque “nada” nunca é nada; algo
o inspirou, moldou, catalisou. Assim como “nunca” também não pode zerar alguma
possibilidade. E aos poucos – pelo menos, gramaticalmente – você aprende que a
vida é feita de muitas “coisas”, mas de poucas certezas. E
que os momentos definitivos que você
teve, ou que está tendo, ou que eventualmente terá e nem os imagina ainda,
estes sim significam algo.
O que nos traz de volta à louça suja que, por sua vez, significa
tudo sobre o qual eu nunca quis ter parte. Sobre responsabilidades,
conseqüências, compaixão, aceitação e aprender a aprender a amar a vida, seja ela
torta, aleatória e mal lavada. Tem a ver com o fato de que eu nunca quis
crescer, de que eu acreditei que muitas coisas durariam para sempre, e de que
eu ignorei o máximo que eu pude a minha incapacidade de aprender a enxergar a
vida como todos ao meu redor a viam: como ela é de verdade. Bagunçada,
atarefada, conturbada, barulhenta, impiedosa e injusta.
Mas é a mesma vida que me trouxe você. E é a vida que nós já
dividimos há algum tempo, independente do que mais pudesse nos acontecer. E
trágico, trágico mesmo seria se depois de tudo o que passamos, a razão da nossa
desconstrução acabasse por ser... Nós mesmos.
Eu sei que muito do que digo é metafórico, e muito do que eu penso
é ilusório, e muito do que eu escrevo é abstrato. Mas nada disso nunca me
impediu de ser autêntico acima de tudo.
E repare também quantas linhas eu passei construindo teorias, crenças e
superstições, apenas para ignorar todas elas com uma só frase – assim como a
vida faz com a gente, eventualmente. Foi em um dia qualquer desses que o mundo
que eu conhecia acabou. E depois acabou de novo. E de novo, e de novo... Até eu
ser obrigado a deixar parte das minhas crenças de lado e aprender a aceitar a
aleatoriedade do universo. O mesmo universo que gira interminavelmente, mas que
ao contrário do que eu gostaria, não é ao meu redor. E são essas voltas que nos
deixam tontos, e enjoados às vezes da vida que a gente leva. São essas voltas
que fazem com que a gente se choque um com o outro, e que nos leva para longe
mesmo quando não paramos para pensar ao certo se isso era... Bom. O certo.
A desconstrução está por toda parte. Gramaticalmente,
emocionalmente, universalmente. O que me faz ser cada vez mais grato por você
que – ok, vamos admitir – foi o que me colocou aqui. Muito além das trinta
linhas que eu gostaria de ter dedicado para este devaneio em particular, porém
mais próximo de escrever o que tudo isto realmente quer dizer...
Eu sinto muito. Por mim. Por você. Por nós. Por tudo. Eu sei que
nada dura para sempre, mas isto também não significa que precisa terminar
agora. Acho que já passei por fins demais por enquanto. Algo precisa durar, e
se eu tivesse algum poder de escolha sobre isso, eu optaria por nós.
Claro que isto não resolve o problema da louça suja. Mas é um
começo... Não é?
*Escrito em 25/05/2015.