terça-feira, 8 de setembro de 2015

O jogo do desapego


A coisa mais Iguaçuense que eu vi nos últimos dias foi um homem que pude considerar como religiosamente extremista, marchando entre a avenida Brasil e a Presidente Kennedy enquanto carregava uma placa que anunciava o apocalipse ao sinalizar que “Deus está voltando”. Até aí tudo bem; este não é o primeiro estagiário divino a calcular errado o dia do juízo final que eu já encontrei por aí. O que foi interessante foi passar por ele em outras ocasiões e descobrir que ele possui mais versões daquela placa do que eu esperava; com o mesmo aviso, mas em outras duas línguas diferentes – inglês e árabe. E mais uma vez eu me peguei pensando sobre o quanto Foz do Iguaçu é fascinante a nível global, mesmo quando me pego sendo informado do seu eventual fim.

Apocalipses à parte, eu continuo dando continuidade ao que já pode ser considerada a minha maratona pessoal de assuntos aleatórios – que, por sua vez, inclui a própria atualização semanal desta página infame – enquanto meus planos profissionais aproveitam o fim do inverno para hibernar um pouco mais. E talvez tenha sido a lembrança daquele sujeito tão preocupado em avisar todas as pessoas de todos os povos que nenhum deles resistirá ao arrebatamento – ou o fato de que House of Cards só volta em Fevereiro – que uma vontade tanto quanto suicida me cativou a fazer o download das cinco temporadas de Game of Thrones como forma de ocupar os meus dias sem luta/dias sem glória.

Eu sei o que vocês que já assistiram estão pensando em me dizer: todo mundo morre (risos, risos, frustração súbita). Mas se uma série de fatalidades iminentes realmente me impedisse de assistir algo, eu não deixaria minha cama de manhã para servir de espectador aos comentários ironicamente críticos do Chico Pinheiro no Bom Dia Brasil sobre as últimas chacinas nacionais enquanto tomo meu café com leite. No entanto, algo para o qual eu não estava preparado – e talvez os fãs mais antigos sintam um pingo de saudade com a minha inocência aqui – foi descobrir que todo mundo morre mesmo: começando aos 5:51 minutos do primeiro episódio, com uma decapitação surpresa, até... Bom, eu só assisti ao primeiro episódio, mas isto parece servir mais para estabelecer o começo de rotina do que para nos assustar. Conforme as duas decapitações que vieram logo em seguida puderam demonstrar.

Depois de uma leve pesquisada sobre as críticas do primeiro episódio em sites do gênero – que, por sinal, foram bem sucedidas em me esnobar ao segregarem as reviews dos episódios em dois grupos: os experts que leram os livros antes, e os novatos (que, talvez assim como eu, só começaram a assistir devido a um amigo expert insistentemente chato) – eu já pude ter uma noção mais clara dos valores inclusos neste mundo fictício para prenderem a minha atenção pelos próximos capítulos. Valores como lealdade, honra, família... Dentre outros fatores-chave que a HBO eventualmente inclui em todos os seus programas: sexo, violência e efeitos especiais. Mas o que me chamou a atenção mesmo foi uma lição mais sutil, quase subliminar entre todo o sangue falso e as paisagens épicas: o desapego.

Eu não consideraria a arte do desapego como um dos traços mais marcantes da minha personalidade, até levar em consideração o que tenho feito até decidir participar da chacina – créditos ao Chico Pinheiro por implantar este termo na minha memória – de Game of Thrones, onde aparentemente ninguém de quem eu goste sobreviverá. Mas a mudança de Cascavel, a decisão de começar uma nova faculdade, a tentativa de reconstruir uma vida do zero mais uma vez... Dizer adeus às coisas e as pessoas nunca foi o meu forte, mas assim como Ned Stark eu entendo que às vezes é preciso deixar o seu reino e sua família para trás por um bem maior. Talvez as minhas escolhas não possuam um caráter tão épico, mas foram revolucionárias para mim tanto quanto migrar para o Sul a pedido do Rei.

Isto é, até um cara (que eu ainda não entendi direito quem é) empurrar o filho do Ned da janela de uma torre, porque ele viu o cara transando com a rainha de um outro reino. A ficção pode ter seus exageros, mas eu sempre defenderei suas intenções. E é bom saber que ao menos no meu mundo eu não preciso me preocupar em ser decapitado de surpresa; só com alguns atentados contra ao meu ego quando vou longe demais na linha do tempo do Facebook e dou de cara com a foto de alguém feliz e bem sucedido.

Tudo bem; o inverno está terminando.