domingo, 13 de setembro de 2015

Muito Igor por nada


Vamos lá, Igor: escreva o que vier...

O que eu quero dizer desta vez? Hum... Ainda não sei. É difícil escrever quando não há mais um motivo aparente. Aliás, não sei da onde eu tirei que é necessário haver um motivo. Não me lembro quando foi exatamente o momento em que eu decidi que as coisas precisavam ter um motivo para existirem; quem diria, então, meras palavras. Serem sinceras não é mais um bastante? Não me lembro. Já faz algum tempo que para sentar e escrever, eu preciso antes sair por aí para buscar inspiração.

“Inspiração”, por sua vez, pode representar o conceito teológico sobre o qual todas as obras do mundo foram feitas de tal maneira através da supervisão divina do Espírito Santo para que fossem facetas intimamente reveladoras de Deus em si, ou apenas o processo de sugar o ar para dentro do organismo para liberá-lo para fora do corpo logo em seguida através da expiração, conforme a ordem natural do sistema respiratório humano.  Mas também há uma terceira significação para o termo; talvez a mais comum e, obviamente, a mais complexa de se canalizar: a inspiração artística – que, diga-se de passagem, não possui nem um artigo na Wikipédia que a defina bem, sendo resumida meramente a “algo que surge dentro do ser humano que o motiva mais a desenhar ou pintar, pois esta sensação lhe trará prazer ou orgulho”.  Já que estou sendo sincero: eu esperava mais de você, Wikipédia.

Houve um tempo em que eu não acreditava em “inspiração”; caso alguém fosse bom em alguma coisa, não era necessário aguardar por uma intervenção divina ou uma voz interior que motivasse a pessoa a realizar uma obra de arte, independente da sua moldura. Minha crença perante a inspiração era equivalente a uma famosa pérola do pensador contemporâneo Fausto Silva: “Quem sabe faz ao vivo!” E ao olhar em retrospectiva, também é possível perceber que a minha natureza prepotente não é nada recente, o que faz da minha falha perante os meus próprios valores algo ainda mais amargo de engolir. Mas cá estou eu, buscando novas histórias e outras maneiras de enxergar o mundo a medida que eu o exploro um pouco mais a cada dia, para que eu possa sentar diante de uma folha em branco do Word no computador sem me sentir intimidado por ela. “Você não me assusta, Word, porque eu sei exatamente o que quero escrever. Porque aconteceu isso, isso e isso, que me fez pensar nisso, nisso e nisso. Ah, e enquanto tudo isso rolava na minha cabeça, ao fundo estava tocando “Tears Dry On Their Own” da Amy Winehouse”. E pronto: “Post novo! Sobre algo rotineiro, algo não tão rotineiro e algo absurdo para chamar a atenção”. Eu costumava ser melhor do que isso. Mais espontâneo e menos sistemático: termos que serviriam muito bem para aquele pobre artigo sobre inspiração na Wikipédia. Por que então eu me rendi a fórmulas e a famigerada arte de fazer sentido? Ah, sim... Porque quando não há sentido... Bom, o que há? Talvez nada.

Quando eu morei sozinho por anos e não havia contratado nenhum plano de internet ainda, passava madrugadas escrevendo sobre “nada” – e entenda que a minha definição de “nada” contempla muito, mas muito sentimento esparramado pelo chão que eu tentava de alguma maneira emoldurá-los. Não para exposição como me sacrifico hoje em dia para fazer – sem ninguém me pedir nada, diga-se de passagem. Queria emoldurá-los para mim mesmo: para que anos depois eu pudesse reler e sentir que já havia tido momentos de desorientação antes. Era um mapa do tesouro que me levava de volta à mim, e não havia nenhum sentido nisso para mais ninguém que tivesse interesse em tentar segui-lo. Mas era tudo para mim, e nunca foi necessário sair por aí à procura de mais nada para me motivar a sentar e escrever por horas e músicas, até finalmente me sentir confortável na pele de Igor de novo. E mesmo tendo só dezessete anos quando comecei a fazer isso, já era consideravelmente mais independente do que posso dizer de mim hoje em dia. Trabalhava o dia todo, limpava a casa, reclamava de dor nas costas e falta de ar, olhava ao redor de um pequeno apartamento e meus poucos pertences encostados nas paredes, e ainda assim tirava um tempo no fim do dia para traçar meu caminho de volta a mim. Porque amanhã faria tudo de novo e era preciso estar bem. Quer dizer, não necessariamente bem, mas moderadamente disposto. Foram os dias em que aprendi a escrever para viver, e que futuramente me ensinariam que o que eu quero mesmo é viver para escrever. A única inspiração que eu precisava era tentar reencontrar meu fôlego para fazer com o que o dia de amanhã valesse a pena mais uma vez.

Não acho que tenha perdido esse sentimento totalmente, mas não quero mais me prender às desculpas que ando dando a mim mesmo – já que, anos depois, eu continuo fazendo isso sem ninguém ter pedido que eu escrevesse qualquer coisa. Sempre escrevi por mim e para mim e talvez seja isso que esteja faltando nesses últimos capítulos: uma alma disposta a reencontrar-se. Um mapeamento de mim mesmo em vês de crônicas sobre as minhas aventuras em uma nova cidade de novo. Talvez um dia eu aprenda que o meu valor nada tem a ver com o que eu conquistei nessa vida ou os lugares que visitei, mas o quanto eu sempre prezei muito por mim mesmo e os poucos leitores fieis que pude conquistar com a simples arte de ser quem eu sou: confuso, perdido, neurótico, porém leal ao dia de amanhã. Hoje valeu a pena e eu agradeço por isso para quem devo a honra. E espero que amanhã seja ainda melhor, mesmo que não visite grandes monumentos ou cruze fronteiras longínquas. No final das contas a inspiração vem da gente mesmo, disposto a ser quem a gente é dia após dia, sem edições nem preocupações sobre fazer sentido ou não.

E como é de praxe que a ironia da vida me siga aonde quer que eu vá, esta é a primeira vez que eu me disponho a escrever tanto sobre “nada”. Eu estava com saudades desse Igor; seja bem vindo à Foz do Iguaçu. Aproveite sua estadia.