Lá em
Janeiro, quando a faculdade estava prestes a me conceder um grau que, exercendo
a profissão ou não, eu fiz por merecer, deixei um post-it para mim mesmo
grudado na base do monitor do meu computador. Era uma frase que, pra variar, eu
adotei de um seriado porque falou tanto em poucas palavras que ecoou em mim ao
ponto de tê-lo carregado comigo na mudança de Cascavel para Foz do Iguaçu. E ele
permanece em seu lugar – talvez a única coisa nesta confusão toda que eu soube
exatamente o lugar ao qual pertence.
“Você precisa perder tudo antes de realmente conseguir se
encontrar”
Simples,
direto, profundo. Bem como todas as coisas que eu tento dizer, fazer e escrever
na minha vida, mas que nem sempre se safam de serem infames. Mas já estamos no
fim de Setembro, que eu nem vi passar direito porque – eu admito – estava
ocupado demais tentando atravessar todas as temporadas disponíveis de “Game of
Thrones” para sofrer junto com quem já assistiu tudo até a próxima temporada em
2016. E porque, ironicamente, é assim que eu venho me sentindo há muito tempo.
Ansioso pelo ano que vem, porque como diria Manuel Bandeira em sua famosa
sofrência, 2015 teve em si uma vida inteira que poderia ter sido e não foi. Mas
além de não ter sido nada a mais, muita coisa que já estava bem confortável e
familiar para mim, deixou de ser.
Eu me formei
em um dia, perdi meu emprego no outro. Não saiba o que fazer da vida, até arrumar
outro emprego e aprender a me acomodar... Isto é, até eventualmente jogar tudo
para o alto e decidir ir atrás do que eu realmente quero desta vida: que ela
seja vivida. Abri mão do meu apartamento, da companhia dos meus amigos,
coloquei mais alguns quilômetros de distância entre minha família e eu, e fugi
para a fronteira. Porque não queria me acomodar, nem desistir. Queria viver e
acreditava que poderia, mas que levaria um bom tempo até que eu encontrasse no
desconhecido um bar para freqüentar sempre, amigos para irem comigo, e uma nova
definição para “liberdade” que não necessariamente signifique que eu preciso
morar sozinho.
Vale a pena
ressaltar que eu também abri mão de um relacionamento porque, no final das
contas, não era ela. Queria que fosse, acreditei que poderia ser, toda uma vida
mais uma vez... Que não foi. E acontece. Ninguém errou, ninguém previu, e
ninguém será igual depois disto. Eu sei que não serei, e que isso não é
totalmente ruim. Entre ser ou não ser, a vida também tem dessas questões.
Eu abri mão
de tudo para realmente ir atrás do que eu sempre disse que queria, e surtei
mais do que deveria quando três semanas se passaram e nada aconteceu. Quando um
mês passou e nada aconteceu.
E agora:
dois meses. Dois meses, sessenta e dois dias, mil quatrocentas e oitenta e oito
horas... Metade delas gasta em cinco temporadas de “Game of Thrones”, três
temporadas de “House of Cards”, e um sonho. O sonho de fazer com que tudo que
ficou para trás, valha a pena pelo que vem por aí. Só não sei quando, onde,
como, quem ou porque – questões que são, por sinal, perguntas padrões que devem
constar com as respostas em toda e qualquer reportagem.
Aprendi um
pouco sobre Jornalismo na minha primeira tentativa no curso, e ainda carrego
comigo algumas aulas, algumas lições... Alguns arquivos salvos no computador de
trabalhos e matérias de prova. Ah. E o arrependimento.
Hoje eu saí
pra correr, como quase todo dia tento fazer para criar a sensação de que a vida
está seguindo adiante, mas tudo o que pude pensar era que havia dado dois
passos para trás. Em dois meses de tempo. É preciso mesmo perder tudo? É
possível se encontrar em uma cidade cheia de turistas de todas as partes do
mundo, mesmo sem nenhum conhecido? Se existe vida em marte, é possível ainda
existir vida em mim para começar mesmo de novo? E quando mais eu me
questionava, mais o coração apertava, os olhos fechavam em dor e saudade, e
mais eu corria. E, por Deus, eu fui longe. Passando da marca onde geralmente eu
paro para caminhar, e da rua em que sempre atravesso para voltar para casa, eu
continuei correndo. E refiz todo o caminho mais uma vez, ainda correndo, até
que o coração finalmente sossegasse. Não sabia da onde vinha toda aquela
adrenalina, aquela garra, aquele fôlego... E foi só depois de finalmente parar
em um sinaleiro e atravessar uma rua caminhando de novo que eu olhei para trás
e vi: o pôr do sol.
Eu corri por
uma hora, por dez quilômetros, por mim. Mais um dia ficou para trás, mas desta
vez ele terminou comigo ali, ofegante e vivo, contemplando mais do que um
avanço físico, mas a descoberta de que ainda existe sim muito mais vida em mim
do que eu pensava. Muito mais fôlego e resiliência para passar mais meses,
anos, o que fosse necessário até que este rascunho de vida criasse forma, históricos,
companhias e, quem sabe, menos barriga.
Você precisa
perder tudo para realmente conseguir se encontrar. E em dois meses talvez nada
muito grandioso tenha acontecido, mas o que eu venho aprendendo sobre mim me
faz pensar que vale sim a pena. Que o meu nome vai ecoar muito mais por aí do
que as promessas e planos que faço para mim mesmo a cada Janeiro. Claro que
isso não me faz querer perdoar 2015 pelas dores, pela saudade e pelo desgaste
todo. Não foi o melhor ano da minha vida, mas talvez seja aquele tempo que toda
temporada tem para preparar suas histórias antes delas puderem mesmo acontecer.
E que quando acontecem... Uau.
É isso que
2015 está sendo. Uma vida que poderia ter sido e não foi, porque eu nunca irei
me acomodar. Talvez ainda leve mais alguns meses, mas que servirão para que eu
descubra que consigo ir ainda mais longe do que já cheguei.
Seja um
escritor, Igor, ou morra correndo atrás disso. Não sei se existe vida em marte
(pelo visto, existe água), mas ainda
existe em mim.