domingo, 1 de maio de 2016

24 ½


É tudo uma questão de perspectiva. O problema, se você for como eu e só sabe viver em extremos, é que perspectiva é um daqueles benefícios sobre os quais você abre mão em nome de uma tranqüilidade que na verdade nem é tão tranquila assim. Confuso, não? Bom, é nisso que dá viver sem uma perspectiva decente. E são coisas assim que vem tomando o meu tempo enquanto eu permaneço no meu estado de imobilidade literária, sem saber mais como ir pra lá ou pra cá em uma sentença, e sem ao menos sentir vontade de me arriscar no rascunho de um parágrafo. Só não penso que isso chegue a ser uma metáfora exata para o resto da minha vida desta vez, porque anda muito frio lá fora para praticar qualquer exercício. Mesmo que esse exercício seja teórico.

Mas eu acredito que a falta de textos novos que contemplem meu atual estado de espírito esteja atrelada sim a outras questões. Se a formalidade está em demasia, é só porque estou me sentindo enferrujado. E você nunca estará errado ao se portar formalmente demais. O verdadeiro caos nasce do coloquialismo. Talvez, inclusive, o mesmo coloquialismo que provém da intimidade que somente alguns sobreviventes encontram em mim, entre um extremo e outro. Junto à minha mania de transcrever filosofias infames, também perdi o tato por procurar as pessoas. Quaisquer pessoas. Independente de intimidade, agenda ou temperatura. E eu ainda não sei exatamente o porquê disto...

O melhor jeito de retomar a prática é colocando algumas verdades para fora. Se será necessário um desabafo para me trazer de volta – e na falta de um amigo gordo para me acompanhar ao bar mais próximo da minha casa para escutar as minhas lamúrias entre rodadas de cerveja barata – que um desabafo então tome conta desta assustadora página em branco do Word. Talvez as grandes obras nasçam mesmo de desabafos e estagnações emocionais em busca de liberdade uma vez mais. Isso explicaria aquela vez em que Nietzche ficticiamente chorou, assim como toda a teoria sobre o inconsciente que Freud teceu e ninguém realmente percebeu que ele só havia tido um sonho ruim e precisava de um abraço.

Já passam dos nove meses desde a mudança para Foz do Iguaçu. Não é tempo o suficiente para comemorar um aniversário, mas o bastante para justificar que cessem imediatamente todos os instintos de sempre procurar olhar para trás antes de dar um passo adiante por aqui. Porque nenhum lugar por onde eu já tenha passado é como Foz do Iguaçu. E ninguém que eu já conheci por aqui realmente seja como qualquer outra pessoa que eu já tenha adicionada à minha lista de contatos do WhatsApp. Não necessariamente querendo dizer desta vez que Foz do Iguaçu seja dotada de uma mitologia única que eu ainda estou tentando descobrir – talvez ela seja. Só quer dizer que comparações e nostalgias, depois de um tempo, só impedem que qualquer coisa nova realmente tenha uma chance de ser vivida.

Sobre viver em família, não há nada de novo a comentar. É e sempre será um desafio. Uma arte cuja qual nem eu, nem você, nem ninguém realmente dominará um dia com maestria. As mesmas pessoas que te trazem para baixo são as mesmas que te levantam logo em seguida. Por mais infeliz que tenha sido o seu dia, família sempre estará esperando por você quando voltar para casa. Claro, cada um do seu jeito, com sua forma de carinho e oferecendo somente aquilo que poderem doar. E haverão dias em que reencontrar a família em casa não cause grandes emoções... Mas depois de um tempo, o que realmente provoca emoções sem fim em nós?

Sobre relacionamentos... Eu estou disposto. O que não significa automaticamente que um processo seletivo foi aberto. Só significa que ultimamente eu ando saindo mais, arriscando mais... Tentando de verdade. Pela primeira vez, quem sabe. E o que for pra ser, será. Só peço que entenda que quando não te procuro, não significa que não me importo ou não me lembro de ti. Só significa que enquanto eu não terminar de desenrolar este desabafo, seja em palavras ou na vida lá fora, não há como eu demonstrar algum tipo de iniciativa real. Eu poderia te cumprimentar e perguntar se está tudo bem, pelo simples impulso de que não nos falamos hoje nem ontem e eu preciso provar a você que não me esqueci de ti.

Acredite, meu bem, eu não me esqueci de ti.

Enfim, sobre mim. Um desastre emocional à procura de molduras no formato de braços abertos que saibam me acolher. E que saibam que não devem me soltar tão cedo, porque eu não terei a capacidade de procurar um apoio de novo tão cedo. É assim que eu me sinto: rarefeito. Talvez o próximo estágio do inefável seja mesmo o esvaziamento. Algo que não pode ser descrito, não pode realmente ser compreendido. E se não pode ser compreendido... Ele some. A literatura, quando usada para fins poéticos e não específicos, pode ser mesmo incrível. Só deixa um pouco a desejar quando alguém procura saber objetivamente como eu estou. “Bem”, eu acho. Isto é bom o bastante?

***

Não haverá mais republicações por um tempo. Ando vivendo demais em minhas memórias – literariamente, ao menos. E se não puder viver literariamente assim como praticamente na vida lá fora, a campanha para me tornar um escritor deverá ser deixada de lado. E isto não é algo que eu desejo. Já sabemos, ao menos, que ainda há vida disposta aqui. Para tentar se tornar algo a mais e, quem sabe, para se entregar de verdade a outra alguém de novo.

Sinto muito se este tipo de desabafo ou filosofia te confunde. É difícil para mim também, ser claro quando não há muito ao que se amparar. Emocionalmente, pelo menos. Por ora. Mas eu farei um esforço, por mim, de tratar de colocar meus assuntos em dia. Estou cercado de post-its e rascunhos, apenas esperando para serem trazidos à vida. E para que me tragam à vida também. A melancolia de um escritor nada mais é do que uma depressão otimista. Aquela que procura ser algo a mais. Algo melhor. Eu ainda não sei dizer como estou me sentindo, mas é isto que procuro.

***

Fim da inspiração. Por enquanto...