Estabilidade.
Esta é a meta. A tão sonhada despreocupação emocional, somada pela
independência financeira e a liberdade que pode abranger ou não uma dose
saudável de libertinagem também. Mas para isso é preciso ter um foco, um plano
e o mais importante: uma infra-estrutura. Estas são as palavras-chave que me
trouxeram até Foz do Iguaçu, aonde qualquer um irá lhe confirmar a primeira
marca registrada da cidade: o calor.
Quanto
a isso não há argumentos, e é o que eu vejo escancarado nos jornais todos os
dias: tudo ensolarado o tempo todo, sempre. Pode não ser o clima mais agradável
de todos, mas sem dúvida é condizente com ao menos a filosofia da minha meta –
é estável. E por ser tão destrutivamente abençoada de vitamina D, Foz do Iguaçu
me permitiu retomar um dos meus velhos hábitos: a corrida.
Ao
ter me familiarizado a cada dia um pouco mais com a minha parte da cidade,
ficou fácil traçar uma rota para seguir em busca de uma vida mais saudável e,
em algumas ocasiões, um mal humor menos saturado. Porque além de um hábito e de
uma fonte quase inesgotável de metáforas sobre “seguir adiante”, “correr
atrás dos objetivos” ou “dar valor ao
caminho em vês da velocidade”, correr também me permite desfrutar de um
precioso conceito psicanalítico: a sublimação.
Confesso
que não sou o maior fã da psicanálise, mas meu passado recém graduado na
ciência do comportamento humano não me deixa esquecer que existem mais teorias
sobre o homem entre o céu e a terra do que só a minha abordagem do coração – a
analítica-comportamental – pode compreender. Para quem não é da área, não se
considere inferior - porque, vez por outras, eu gostaria de ser só um cara
normal, sentado em um bar, indiferente à má fé alheia. Mas não. É como um
sensor de presença que acende automaticamente ao calor da neurose de alguém. E
só até aqui eu já fui capaz de jogar a análise do comportamento, a psicanálise
e o existencialismo em um ventilador literário, só para ser pego pela bagunça
que surgiu: muito prazer, antes de qualquer coisa, mas pode me chamar de Igor.
Enfim,
sobre a sublimação: reza a lenda de Freud que o ato de sublimar é primeiramente
inconsciente, e consiste na reutilização de energia que antes estava sendo
reservada em um determinado fim, para ser aplicada em outro considerado mais “produtivo”. É como ser capaz de perceber
o lado bom da raiva, ou enxergar o copo meio cheio em vês de meio vazio –
apesar de que, cá entre nós, não existe um lado bom da raiva quando se está
diante de um copo meio vazio. E cá estou eu me enrolando na correria da minha
prosa de novo em vês de me preocupar com coisas mais importantes: o que neste
caso seria fazer um pingo de sentido.
Voltando
à corrida, que só pela sua descrição já demonstra todas as curvas que aprendi a
fazer pela cidade, este pequeno vislumbre de “vida movendo adiante” que consegui restabelecer à minha nova rotina
tem me feito mais bem do que eu esperava. Independente do calor, da sublimação
e da distância, antes de qualquer meta ser atingida é preciso reconhecer bem o
terreno a ser explorado daqui em diante. É preciso criar um relacionamento com
as ruas, atribuir algum significado às avenidas e espalhar lembranças pelas
passarelas que cruzo em minha sonda diária. Antes de qualquer sucesso ser
atingido em Foz do Iguaçu, é preciso primeiramente fazer parte dela. E isso só
será possível depois que eu deixar de me sentir como um intruso a cada vez que
passo pelo rol de entrada do meu prédio ou quando atravesso qualquer cruzamento
do qual eu ainda não entendo direito o timing do semáforo.
O
que quero dizer é que, bem, eu estou tentando. Estou saindo, explorando,
investigando, refletindo e agora correndo pela cidade em busca dos meus
objetivos. Sejam eles uma carreira bem sucedida, um novo horizonte para a minha
liberdade ou – por que não? – alguns quilos de desemprego, insegurança e
ansiedade a menos.
A
verdade é que Foz do Iguaçu e eu ainda não temos nada sério; estamos só “ficando” um com o outro. Mas
definitivamente há potencial para algo mais estável.