Saudade. É o primeiro sintoma de toda
mudança de vida. Como via de regra a vida se transforma constantemente, mas
como todo pessimista de carteirinha sabe, isso não significa necessariamente
que as coisas melhoram. Esta é a questão que eu carrego ultimamente,
especialmente considerando os meus próprios laços com o mundo além da terra das
Cataratas. Não que eu seja um pessimista de carteirinha, porque “esperança” provavelmente se
classificaria entre as dez palavras que mais uso em toda e qualquer dissertação
argumentativa que eu já fui capaz de produzir, mas talvez não seja isso o que
implica a crença ou descrença de alguém perante as coisas. Não. Talvez tenha
mais a ver com a importância que a gente dá para os nossos fragmentos,
independente deles serem reais ou não.
Não me lembro se foi Saint-Exupéry quem
me ensinou sobre a vulgaridade das coisas, até que se decida que elas deixarão
de ter tal natureza para se tornarem algo único. Ou foi ele, ou foi a minha mãe
quem sempre repetia que é importante dar valor para o que se tem – o que, por
sua vez, justifique a minha incessante mania de supervalorizar a proporção dos
meus problemas. Enfim, nada disso importa muito agora. O que importa mesmo é a
maneira que eu ando tratando as fotos antigas salvas no meu celular, os textos
antigos no arquivo do meu computador, e o tempo verbal que passou a dominar as
minhas conversas com meus amigos e familiares: como um tenso passado.
Era de se esperar que as minhas
interrogações encontrassem um jeito de se infiltrar nas dúzias de caixas que
empacotei para trazer a minha vida até aqui, mas eu ainda me peguei
desprevenido perante o mundo novo e o antigo. Entre uma das cidades mais
famosas do país em termos de cultura, lazer e turismo, com outros países a
vista nas placas (dependendo da via rápida que você pega para chegar ao centro),
e outra bem menos conhecida, localizada mais ao interior do Oeste e,
ironicamente ao meu ver, no coração do Paraná. Mas irônico mesmo era me sentir
bem mais confortável em um lugar incomum, do que um pouco deslocado entre os
moradores, os turistas e os estrangeiros que passam por mim quando tento sair
para explorar um pouco mais o meu novo plano de fundo. Houve um tempo, mais
adolescente e apocalíptico da minha personalidade, em que eu costumava
descrever esta sensação como estar perdido em uma multidão. Mas isso nunca foi
tão sincero quanto a primeira vez em que perambulei pelas ruas da Avenida
República Argentina sozinho. Mais irônico ainda foi pensar que mesmo se eu
tentasse pedir uma direção para alguém, seriam grandes as chances de eu me
deparar com um gringo que não entende português.
Enfim, a saudade é inevitável, mas é o
primeiro estágio rumo a qualquer coisa nova que eu queira descobrir por aqui.
Se toda e qualquer mudança tem suas fases, assim como um luto deve ser aceito, sentir-se
deslocado por enquanto é o prelúdio da adaptação. Afinal de contas, já aprendi
os nomes de algumas das principais ruas, o caminho para o terminal, a
rodoviária, o mercado mais próximo, o zoológico e – claro – o shopping. É só
uma questão de tempo para que eu saia para caminhar distraído e acabe cruzando
uma fronteira. Apesar de desorientado, é reconfortante saber que para onde quer
que eu vá daqui, minhas inseguranças ao menos serão internacionais.
É como dizem os avisos nos espelhos
retrovisores dos carros: as imagens refletidas estão mais próximas do que
parecem. Talvez eu devesse ter olhado para trás uma última vez antes de seguir
em frente.