sexta-feira, 28 de agosto de 2015

El próximo mes


Foz do Iguaçu. População: aproximadamente 263.647 habitantes conforme as estatísticas do IBGE, desde a última vez em que alguém atualizou este artigo na Wikipedia. E desde 27 de Julho de 2015, 263.647 habitantes, mais 01 Igor.
Seja bem vindo à terra das Cataratas! Boa sorte para agüentar o calor.

Já faz um mês que tudo mudou. Ou mais precisamente, faz um mês que um caminhão de mudanças trouxe a mim e os meus pertences para a beira do país, junto com a minha esperança de que tudo mudasse. Demoraram alguns dias para que cada coisa encontrasse um novo lugar, e que algum esboço de rotina fosse construída, mas definitivamente ainda levará mais algumas ondas diárias de calor até que eu possa dizer que me sinto mesmo em casa.

O começo das coisas é decepcionante e desencorajador. É como finalmente decidir começar a assistir “Game of Thrones” depois de já terem produzido cinco temporadas e dos meus amigos que já assistiram me avisarem a não me apegar a nenhum personagem porque todo mundo morre. Bom, se eu fosse levar isto mesmo a sério, a vida como um todo não é assim também?
Isto não deveria me impedir de trilhar o caminho. Mas o começo... Ah, o começo. É um saco. Também foi assim com “Breaking Bad” e “House of Cards”. E pelo jeito serializado que ando levando a minha vida – especialmente após os finais de temporada da faculdade e do meu tempo em Cascavel – provavelmente será assim também com Foz do Iguaçu. Walter White não se tornou o fodão da metanfetamina em uma temporada, nem Frank Underwood usurpou o poder de todos que estavam acima do seu cargo em Washington em 13 episódios. Foi preciso controlar a ansiedade para continuar assistindo, e mais de uma temporada para que os personagens e a história em si se consolidassem em algo mais palpável do que meros roteiros. Roteiros que, em termos de vida, podem ser traduzidos como planos. Que são só o que tenho por enquanto.

Sobre a cidade eu já conheço um pouco. Mesmo sem grandes progressos, muita coisa pode acontecer em uma temporada. E em um mês de vida real já consegui visitar marcos históricos, corri por quase toda a Avenida República Argentina (e avisei alguns quatis pelo caminho, o que pode ser considerado normal pelos Iguaçuenses mais habituados), presenciei o show de iluminação da barragem da Itaipu à noite, e expandi minha cultura gastronômica por alguns restaurantes temáticos – mas sem abrir mão de uma pizza às vezes. Me decepcionei ao ir até o Duty Free na fronteira da Argentina para comprar mashmallow e não encontrei, então segui em frente até Puerto Iguassu – porque pelo jeito que as coisas andam, é mais barato dar um pulo até o país do lado para comprar azeite e dar sorte de encontrar as últimas garrafas de Pinot Noir em um mercadinho, do que me desfazer de preciosos reais em território nacional. E o mais surpreendente de tudo: em apenas um mês eu já consegui decorar meu próprio CEP.
Ah, e clareei minhas idéias sobre o que quero fazer da minha vida, etc, etc. Fiquei empolgado mesmo em saber dizer aonde moro com todos os números possíveis, caso algum quati me ataque quando for sair pra correr e invoque algum deles sem querer. Porque estamos falando de Foz do Iguaçu, minha gente, e tudo é possível.

Minhas metas são claras:
1) Reaprender a viver em família, porque depois de seis anos de independência juvenil em Cascavel, é difícil se adaptar a regras e disciplina – ainda mais quando se mora em um condomínio;
2) Cursar a faculdade de Jornalismo (até o fim desta vez), e trilhar minha carreira profissional desde o primeiro dia – como uma professora de psicologia me ensinou em minha primeira graduação que é como faculdades devem ser encaradas, caso queira-se fazer um futuro delas;
3) Aproveitar tudo o que a terra das cataratas pode oferecer em termos de cultura e turismo – sem correr o risco de pegar insolação ou causar algum incidente internacional ao encher a cara e cruzar a fronteira de algum país próximo – o que, convenhamos, pode acontecer.

Como um todo, eu posso dizer que este primeiro mês foi produtivo. Do jeito que a primeira temporada de uma série estreante deveria ser. Criar a base para eventos futuros e semear plots para crescimento pessoal: confere. Quero fazer com que isto dê certo, mas como já escrevi em outro blog – um “amanhã” atrás – nada acontece da noite pro dia; mesmo quando se está próximo de duas zonas francas internacionais diferentes. Diante do resto da minha nova vida pela frente, algo permanece constante: vai ficar tudo bem – repetiu ele, incrédulo, até realmente acreditar.


Agora é com você, Foz do Iguaçu: prove que valerá a pena.

 

terça-feira, 25 de agosto de 2015

Fé, e outros rascunhos


A cada dia que passa, eu tento me situar um pouco mais com a minha nova realidade. Uma realidade que, neste caso, envolve Foz do Iguaçu: uma das cidades mais dinâmicas em termos de turismo, cultura, entretenimento e possibilidades de vida em níveis internacionais. São tantos restaurantes, casas de shows, museus, parques temáticos, maravilhas da natureza...  Que às vezes eu me surpreendo um pouco com o quanto eu fico entediado em casa.

Porque, sinceramente, viver cansa. Explorar novos lugares pode ser trabalhoso. Provar novas cozinhas pode ser caro. E ter novas experiências tem lá a sua famigerada margem de erro. É fácil arquivar algo como “experiência” depois de ter passado por momentos de desgosto e estresse. Mas a minha meta hoje vai além de tudo isso. Minha meta hoje é de aprender a ser feliz, tranqüilo e grato pelo que eu tenho: uma oportunidade de recomeçar, o tempo e a infra-estrutura o suficiente para fazer isto.

Isto é, até aquele teste.

***

Dia desses eu fiz um teste online sobre traços de personalidade e sabotadores mentais que anulam a sua inteligência, dentre outras palavras-chave muito atraentes que me seduziram a clicar em “aceito sem ler os termos deste teste que pode ou não coincidir com uma resposta que você procura neste momento”. E de acordo com nossas análises, Igor, clique neste outro link e leia em preto e branco os resultados que obtivemos através do nosso longo e repetitivo questionário sobre como você lida com estresse, situações-problema e outras neuroses cotidianas. E ainda geraram os resultados em inglês, para dar mais credibilidade na nomeação dos meus déficits.

Enfim, a aleatoriedade do questionário – que, devo deixar claro, não influenciam em nada na sabedoria milenar que envolve a produção de biscoitos chineses da sorte – decidiu que o meu problema é o excesso de autocrítica, mas em um sub-nível diferente: a hiper realização. A necessidade constante de atingir novas conquistas e de, conseqüentemente, atribuir a minha auto-estima a elas.

O que fez todo o sentido para mim hoje, que vivo em uma cidade que comporta inúmeras possibilidades e que desperta em mim a constante necessidade de explorar ao menos uma delas por dia. Porque eu decidi mudar de vida e decidi que isto deverá valer a pena – o quanto antes, porque meu tédio é inversamente proporcional à minha ansiedade. Será que isto caberia em uma fórmula ou algo do tipo?

***


Ok. Digamos que seja só coisa da minha cabeça, e que não haja nada nem ninguém me cobrando resultados que aparentemente eu não estou entregando ainda. Seja através de viver novas experiências ou finalmente cumprir velhas promessas de ano novo. Eu não sei. Mas em um novo capítulo das minhas irônicas desventuras, fiz uma limpa na pilha de rascunhos que compõe mais da metade da minha mesa e encontrei um que me chamou a atenção:

 

Talvez fosse mesmo uma crise existencial; a eterna procura por algo a mais, ou o teste definitivo pelo qual todos os seres humanos eventualmente passam durante o curso da vida – o da fé. Fosse o que fosse, decidi que valeria a pena dedicar o meu sábado para explorar outras partes de Foz do Iguaçu, como o famoso templo budista, na esperança de encontrar mais algum sinal. Mas só o que encontrei foi o aviso no muro de entrada: horário de funcionamento das 9h30 às 16h30. E às exatamente 16h36, eu senti que parte da minha fé ficou abalada.

Em seguida decidi visitar outro templo; a mesquita que reúne a segunda maior comunidade muçulmana do Brasil... também fechada para visitação.

Por último, a caminho de volta para casa, passei pela igreja católica matriz – com uma grande placa que dizia “EM OBRAS” bem em frente à porta principal. E a essa altura pensei que o problema não fosse a minha fé, mas a minha falta de planejamento.

***

No final das contas, eu decidi que meus pensamentos não estavam realmente voltados para fé, ou o segredo da vida, ou a psicologia da minha inquietação. Minha necessidade instintiva de encontrar uma resposta satisfatória eventualmente sossegou com o entardecer e deu brecha para uma nova teoria, representada pela fórmula abaixo:


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Independente dos meus questionamentos, Foz do Iguaçu está fazendo jus à sua proposta turística de pelo menos levar a minha mente a novos rumos... mesmo que eu acabe com dor de cabeça em um beco sem saída. Tudo bem; vale como experiência.

sexta-feira, 21 de agosto de 2015

Algo novo?


O melhor aspecto da minha vida em Foz do Iguaçu hoje também é o pior: tudo é novo. Por um lado me sinto perdido por sair pelas ruas da cidade sem saber exatamente para onde estou indo ainda. Por outro, me sinto confortável na minha confusão por ter o habeas corpus de ser “de fora” e não ter a responsabilidade inata de saber para onde estou indo. Se ao menos isto valesse no meu contexto de vida e não só na geografia, eu estaria bem mais tranqüilo. Mas também não haveria nada para escrever aqui. E no final do dia eu gosto de ter o que registrar, nem que seja só para apuração do placar entre a cidade e eu.

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Round #1

Acordei com um bom humor inexplicável. Talvez fosse o despertar preguiçoso que por um instante deixa a minha realidade embaçada, ou talvez fosse só o cheiro de café vindo da cozinha. Independente do que fosse, foi um daqueles dias em que você acorda disposto, encorajado, inspirado a fazer da sua vida algo significativo. Era cedo na semana para qualquer sentimento de “carpe diem”, mas por passar a maioria dos meus dias em casa sem planos ou renda, a atemporalidade do desemprego toma conta do relógio biológico. Isto é, exceto pelo meu Masterchef nas noites de terça-feira. Enfim, algo me levou a abrir a janela como forma de dar uma chance para a vida me surpreender. Mas ao contrário de um céu azul e uma proposta milionária de trabalho, encontrei cinzas, chuva e um lagartixa – que, claro, pulou para dentro do meu quarto e se apossou da minha cama. Um breve assassinato depois, fechei a janela novamente e deixei qualquer sentimento de esperança do lado de fora. Não me importo tanto com o clima tropical lá fora, mas do meu ecossistema cuido eu. E o meu ventilador.

Foz do Iguaçu: 1 x Igor: 0

***

Round #2

Andando pelas ruas da cidade, me deparei com um papel grudado em um ponto de ônibus. Por um instante pensei que fosse só alguma propaganda qualquer, do tipo que compra/vende ouro ou contato de moto-táxi, até que parei pra ler com atenção (e antes que você me questione, a resposta é sim: eu ando tendo muito tempo livre):


“Marina, a Aline ta te procurando. PS: Desculpa eu te procurar assim, mas eu não sabia mais onde te encontrar. PS: Vou te esperar no mesmo lugar as 21h.”

Foram tantas perguntas que me vieram à mente, mas até agora apenas uma dúvida em particular ainda me incomoda: tudo bem a pessoa estar perdida e não saber como encontrar a Marina, até porque, quem sou eu para questionar métodos para encontrar qualquer coisa? Mas como alguém que aparentemente sabe diferenciar “mas” e “mais” me peca logo no uso da crase?
Eu não conheço nem a Marina nem a Aline, nem sei que ônibus passa naquele ponto. Mas mesmo nos meus piores momentos de desorientação, eu ainda soube me apoiar na gramática.

Foz do Iguaçu: 1 x Igor: 1

***

Round #3

Segunda feira à noite, tentando me manter fiel à proposta de que qualquer experiência nova que Foz do Iguaçu possa me proporcionar é válida, eu sacrifiquei um princípio de uma das minhas maiores crenças – a gastronomia – e concordei em sair para jantar em um restaurante chinês, já que a maioria dos outros restaurantes temáticos estavam fechados. Não é nenhum preconceito contra a cultura oriental, mas massa e legumes para mim sempre pertenceram à classes cuidadosamente separadas e não unidos pelo curry em um yakisoba. Mas eu admito que não estava ruim, assim como os rolinhos primavera da entrada também me surpreenderam felizmente com seu recheio de legumes. Só que a surpresa mesmo veio na saída do restaurante, quando abri meu biscoito da sorte:


“Na vida você deve fazer o que gosta, senão, acaba trabalhando.”

Entre paralelas que não se encontram em centro algum e o clima exponencialmente vulcânico, Foz do Iguaçu parece estar me mostrando aos poucos que nada aqui é como qualquer experiência que eu já tive antes, mas que isto não significa que poderá valer a pena caso eu continue saindo por aí e permitindo que a cidade me surpreenda. No mínimo ela já me provou que vale a pena só pela ironia na minha sorte do biscoito. Às vezes um desvio incerto pode levar ao caminho que você procurava desde o começo.

Placar final: empate técnico (por enquanto).

terça-feira, 18 de agosto de 2015

Três semanas depois...


...eu vi a minha vida passar diante dos meus olhos. Ou melhor, a minha vida anterior a esta. Na verdade é estranho tentar colocar em palavras o que eu fiz porque ainda é algo que não faz muito sentido. Mas em termos objetivos, eu estive em Cascavel, no interior do Paraná pela primeira vez desde que me mudei para Foz do Iguaçu. Para você que não me conhece e por acaso trombou com este link, jamais entenderá o que isso quer dizer. Mas para você que me conheceu enquanto eu ainda morava por lá, eu sei que isso parece mais claro.

O enredo: há seis anos eu me mudei para a cidade de Cascavel com o intuito de estudar Jornalismo. Mas planos são coisas tão frágeis e propensas a mudanças como, bom, pessoas. E entre tantos desvios que a gente faz na vida, desde mudar de idéia até mudar de CEP, eu optei por cursar outra faculdade – a de Psicologia. E a minha história em Cascavel se desenrolou desde o primeiro dia de aula do curso “errado” até alguns meses após o dia da minha formatura do curso “certo”... Até eu descobrir mais uma vez nesta vida que certo e errado não existem, e que no final das contas eu estava pronto para ingressar um mercado de trabalho, mas não o que eu realmente queria. Pode parecer um pouco confuso, mas por enquanto escrevo para mim e para algumas pessoas em especial que ainda acham interessante acompanhar os próximos capítulos da minha nova história: cursar Jornalismo de novo, desta vez do começo ao fim, em Foz do Iguaçu.

Eu sinto que os marcadores que ando inserindo em meus textos tem se repetido bastante, mas acredito que seja porque joguei seis anos de histórias, amizades, relacionamentos e sonhos em um ventilador e nem todos os pedaços voltaram ao chão ainda. E o que eu senti ao adentrar território Cascavelense de novo não tem outro nome: estrangeirismo. Estar de volta na cidade em que morei em três apartamentos, cursei uma graduação e meia em duas faculdades diferentes e conheci uma série de pessoas incríveis e inimagináveis, e de repente perceber que não há mais um espaço para mim lá foi devastador. Porque por seis anos – os seis anos que morei sozinho e cheguei mais próximo de alcançar a minha independência – fui eu quem havia definido bem o meu espaço, as minhas regras (que simplesmente existiam para fins decorativos) e a minha liberdade. E era eu quem descia para abrir o portão (porque o interfone nunca funcionou direito) para deixar as minhas pessoas entrarem para sentarem na sacada, beberem seu veneno de escolha e desabafarem sobre como é frustrante morar com os pais, ou como é complicado estar em um relacionamento, ou como é impossível às vezes conviver consigo mesmo.

Eu nunca fui uma pessoa fácil de se lidar. Nunca. Desde que me conheço por gente, fui complicado, estressado, convencido, egocêntrico, prepotente, arrogante e auto-destrutivo. Com um famoso dom para acolher e ser companheiro das pessoas que julguei serem merecedoras disto, porque eram pessoas inspiradoras para mim. E estou falando aqui dos meus amigos – os poucos porém insubstituíveis amigos que fiz nos últimos seis anos naquela cidade – que pretendo continuar carregando comigo; nas crises existenciais, nos dramas emocionais, nos grupos de WhatsApp e no coração. Mas me deparar com eles assim, sem emprego, sem rumo e sem saber exatamente o que fazer, foi demais para mim. Logo eles que sempre me pareceram tão determinados e destinados ao sucesso, e que invariavelmente – para mim ao menos – já se tornaram quem gostariam de ser nesta vida. Estudantes, profissionais, lendas aos meus olhos.

Não foi uma viagem fácil. E mais do que aturar a minha personalidade difícil, sempre foi pior ter que admitir em alguns momentos que eu preciso de ajuda. Que as coisas não estão indo como eu planejava porque, bom, eu não tinha um plano quando cheguei aqui – só um caminhão cheio de coisas e um único sonho em mente. O que, se me lembro bem, é bem similar ao que eu passei há seis anos, no começo daquela vida. E eu também tive muita, mas muita teimosia para aceitar que este é só o começo novamente – e que começos por via de regra são uma droga.  E foi assim que, mais uma vez, eu me deixei levar pela ansiedade de que, no final das contas, só fazem três semanas que o meu mundo mudou. Mas foi bom descobrir que o meu legado – os meus amigos e todas as histórias que escrevemos naquela cidade – permanece intacto.

Há quem diga que a vida é uma só. Há quem diga que é feita de ciclos, fases, etapas com começos, meios e fins. Quanto a mim, carrego comigo um dos princípios da minha graduação de Psicologia: eu continuarei fadado às mesmas crises enquanto continuar repetindo os mesmos padrões. Neste caso, o padrão de querer sempre mais do que tudo aqui e agora, e de ser alguém para se aspirar também. Mas eu preciso me acalmar, levar um dia após o outro e, por que não?, renovar as minhas filosofias. Da última vez em que escrevi uma história dessas, o amanhã era tudo.

Acho que agora o que posso adotar é acreditar que hoje, à beira de dois outros países, são inúmeros os caminhos que eu posso seguir. E que segundo o que a minha professora de psicanálise me desejou em uma mensagem de ano-novo, basta que eu encontre o meu e o percorra até o fim.

quinta-feira, 13 de agosto de 2015

Tudo ensolarado o tempo todo sempre


Estabilidade. Esta é a meta. A tão sonhada despreocupação emocional, somada pela independência financeira e a liberdade que pode abranger ou não uma dose saudável de libertinagem também. Mas para isso é preciso ter um foco, um plano e o mais importante: uma infra-estrutura. Estas são as palavras-chave que me trouxeram até Foz do Iguaçu, aonde qualquer um irá lhe confirmar a primeira marca registrada da cidade: o calor.

Quanto a isso não há argumentos, e é o que eu vejo escancarado nos jornais todos os dias: tudo ensolarado o tempo todo, sempre. Pode não ser o clima mais agradável de todos, mas sem dúvida é condizente com ao menos a filosofia da minha meta – é estável. E por ser tão destrutivamente abençoada de vitamina D, Foz do Iguaçu me permitiu retomar um dos meus velhos hábitos: a corrida.

Ao ter me familiarizado a cada dia um pouco mais com a minha parte da cidade, ficou fácil traçar uma rota para seguir em busca de uma vida mais saudável e, em algumas ocasiões, um mal humor menos saturado. Porque além de um hábito e de uma fonte quase inesgotável de metáforas sobre “seguir adiante”, “correr atrás dos objetivos” ou “dar valor ao caminho em vês da velocidade”, correr também me permite desfrutar de um precioso conceito psicanalítico: a sublimação.

Confesso que não sou o maior fã da psicanálise, mas meu passado recém graduado na ciência do comportamento humano não me deixa esquecer que existem mais teorias sobre o homem entre o céu e a terra do que só a minha abordagem do coração – a analítica-comportamental – pode compreender. Para quem não é da área, não se considere inferior - porque, vez por outras, eu gostaria de ser só um cara normal, sentado em um bar, indiferente à má fé alheia. Mas não. É como um sensor de presença que acende automaticamente ao calor da neurose de alguém. E só até aqui eu já fui capaz de jogar a análise do comportamento, a psicanálise e o existencialismo em um ventilador literário, só para ser pego pela bagunça que surgiu: muito prazer, antes de qualquer coisa, mas pode me chamar de Igor.

Enfim, sobre a sublimação: reza a lenda de Freud que o ato de sublimar é primeiramente inconsciente, e consiste na reutilização de energia que antes estava sendo reservada em um determinado fim, para ser aplicada em outro considerado mais “produtivo”. É como ser capaz de perceber o lado bom da raiva, ou enxergar o copo meio cheio em vês de meio vazio – apesar de que, cá entre nós, não existe um lado bom da raiva quando se está diante de um copo meio vazio. E cá estou eu me enrolando na correria da minha prosa de novo em vês de me preocupar com coisas mais importantes: o que neste caso seria fazer um pingo de sentido.

Voltando à corrida, que só pela sua descrição já demonstra todas as curvas que aprendi a fazer pela cidade, este pequeno vislumbre de “vida movendo adiante” que consegui restabelecer à minha nova rotina tem me feito mais bem do que eu esperava. Independente do calor, da sublimação e da distância, antes de qualquer meta ser atingida é preciso reconhecer bem o terreno a ser explorado daqui em diante. É preciso criar um relacionamento com as ruas, atribuir algum significado às avenidas e espalhar lembranças pelas passarelas que cruzo em minha sonda diária. Antes de qualquer sucesso ser atingido em Foz do Iguaçu, é preciso primeiramente fazer parte dela. E isso só será possível depois que eu deixar de me sentir como um intruso a cada vez que passo pelo rol de entrada do meu prédio ou quando atravesso qualquer cruzamento do qual eu ainda não entendo direito o timing do semáforo.

O que quero dizer é que, bem, eu estou tentando. Estou saindo, explorando, investigando, refletindo e agora correndo pela cidade em busca dos meus objetivos. Sejam eles uma carreira bem sucedida, um novo horizonte para a minha liberdade ou – por que não? – alguns quilos de desemprego, insegurança e ansiedade a menos.

A verdade é que Foz do Iguaçu e eu ainda não temos nada sério; estamos só “ficando” um com o outro. Mas definitivamente há potencial para algo mais estável.

terça-feira, 11 de agosto de 2015

A reconstrução


Duas semanas depois, eu já consigo me situar melhor pela cidade. Algumas ruas são mais familiares, as avenidas não parecem tão longas quanto eu imaginava, e o “centro” continua sendo.., bom, inexistente. Não parece existir uma avenida principal em Foz do Iguaçu; apenas um punhado de paralelas que eventualmente se interligam. Enfim, longe de mim criticar a infra-estrutura de uma cidade inteira – logo eu que sequer tenho noção das minhas próprias fundações às vezes. Especialmente quando me perco nas minhas próprias linhas paralelas de raciocínio.

Mas o que me chamou mesmo a atenção sobre a linha do horizonte em um dos centros de Foz do Iguaçu foi a quantidade de edifícios e áreas abandonadas. Obras de grandes espaços que, por motivos que ainda não cheguei a investigar, permanecem com a sua construção em aberto. Obviamente eu não pesquisei nada sobre isso porque estava ocupado demais; distraído como sempre com uma metáfora.

Ao ter me mudado recentemente de Cascavel – ou, como o próprio município foi batizado por seus saudosos embargadores, “uma metrópole em construção” – eu não pude deixar de me sentir especialmente mais acolhido por Foz do Iguaçu. Afinal de contas, pelo que eu pude perceber depois de perambular por aí, nós dois estamos em um processo também. Um processo que ainda me assusta e me impede de realmente tentar sair por aí para garantir o meu espaço no mundo e a minha marca registrada profissional: um processo de reconstrução.

Foz do Iguaçu está incompleta e eu entendo. Para falar a verdade, segundo meus estudos em Psicologia, somos todos seres incompletos em constante transformação. Deixamos planos para trás para seguir novas metas adiante. Abandonamos pessoas que já não combinam mais conosco para dar espaço a novos rostos, novas experiências. Mas na prática a vida é um pouco mais complicada do que os rascunhos que tento esboçar nas folhas em branco do Word. Ficam sempre os rastros, as pegadas, os artefatos. Reconstruções vem e vão, mas é infame pensar que um dia estaremos completos. É o caso de Foz do Iguaçu, o seu e o meu também. O que mais explicaria nossa constante vontade de crescer, de evoluir. De abranger cada vez mais conhecimento, maiores distâncias e profundas vivências. O que eu sempre dificuldade para aceitar é que realmente não há nada de errado com isso. Nem com as mudanças, nem com a saudade, e nem com os rascunhos.

Eu posso tentar de novo. É o que eu vim fazer aqui. E é o que as construções inacabadas que me cercam pelos vários centros da cidade me lembram constantemente. As obras foram interrompidas por um motivo, assim como os planos que eu havia feito para mim no começo de 2015 – o que, ironicamente, inclui a renovação da minha velha promessa de ano novo sobre nunca mais fazer planos. Sou uma planta inacabada e tenho alguns nortes para seguir, mas tudo pode mudar. E felizmente ou infelizmente, algumas construções precisam ser implodidas para darem espaço para outros grandes monumentos. Como a minha carreira, por exemplo, que está apenas começando... Mais uma vez.

Foi assim que eu passei a perceber as construções inacabadas com um olhar diferente – pelo menos, até eu pesquisar sobre as várias obras embargadas, desvios de verbas, contratos fraudulentos e empresas-fantasmas dentre várias outras formas de sabotagem que o ser humano é capaz de fazer pelos fins errados. Também foi assim que eu passei a afiar um pouco mais o meu senso crítico para que quando uma chance de entrar no ramo jornalístico surgir, eu esteja um pouco mais preparado.

Igor Costa Moresca: em obras para melhor entender-me.

quinta-feira, 6 de agosto de 2015

Condições adversas


Segunda feira, 6:45 da manhã. Acordei com um barulho súbito vindo da esquina que vai de encontro à vista da janela do meu quarto. Um barulho inconfundível, de vidro quebrado e gritos de choque, e de vidas sendo interrompidas por algo. Rapidamente me levantei e abri a janela para ver o que era de se esperar: um acidente de carro. Uma van derrapou para evitar a colisão com outro carro, perdeu o equilíbrio e caiu de lado na rua, enquanto o outro carro se evadiu da cena. Ninguém se feriu, e em questão de instantes uma viatura que costuma policiar o bairro encostou para ajudar a família que se sentou no meio-fio para recuperar o fôlego. Também não demorou muito para que a rua fosse fechada até que um guincho chegasse para levantar a van da rua, e para que todos os vizinhos das redondezas e as pessoas que passavam por ali a caminho do trabalho se juntassem ao redor para se horrorizarem com o ocorrido. Eu não consegui mais dormir depois daquilo, até porque o barulho da sirene da viatura precisava alertar os outros motoristas sobre o fechamento da rua. Mais ainda, eu permaneci estarrecido com aquilo; foi o meu primeiro choque de realidade sobre a cidade em que eu estava morando.

Foz do Iguaçu é uma das cidades brasileiras que nunca dorme graças ao seu caráter turístico, mas manter em constante movimento o fluxo de vidas entre as ruas da cidade também abre um potencial imenso para acidentes como aquele. Também não devo criticar muito o trânsito local, especialmente ao considerar a zona de mortalidade em que eu costumava morar, também conhecida como a cidade de Cascavel – um dos pólos universitários do Paraná com teor alcoólico idêntico ao seu caráter. Sobre Foz do Iguaçu, ainda me pego desacostumado com o respeito que encontrei ao atravessar as inúmeras ruas do centro da cidade – é infelizmente de se surpreender quando o motorista reduz a velocidade bem antes da onde deve parar e sinaliza para que você cruze a rua com segurança. Mas ainda considerando o susto que havia me acordado naquela manhã, eu me peguei pensando sobre outros tipos de choques cotidianos – ou, no meu caso, sobre a mudança de direção que eu havia feito recentemente com a minha vida, e para onde eu sinalizaria o meu foco agora.

Recém graduado em uma faculdade, o mundo pós-formatura parece se configurar entre as seguintes vias: uma pós, um mestrado, uma tentativa de se encaixar na área de formação por sorte, empenho ou indicação, ou quem sabe até mesmo tirar umas férias de tudo por algum tempo até que a poeira se abaixasse e os confetes grudados nos sapatos da festa finalmente fossem limpos por completo. Quanto a mim, eu ainda não sabia exatamente o que fazer, salvo pelas escolhas profissionais que fiz desde o momento em que foi me concedido um grau superior. E enquanto não sabia o que fazer, por algum tempo trabalhei em uma área que nem de longe se comparava ao que eu havia estudado e muito menos ao que eu conhecia, até que a frustração do dia-a-dia me venceu por completo, como um conta-gotas pressionando um copo d’água ao limite do seu derramamento. E quando as minhas inseguranças finalmente me inundaram, parecia haver uma única alternativa restante: começar de novo. E depois de me despedir de tudo e de todos, de encaixotar meus pertences e minhas aspirações por algo a mais, eu adentrei uma nova cidade com mais rapidez do que eu esperava e nem tomei nota dos nomes das ruas a caminho do meu novo lar. Isto é, até aquela batida me acordar.

Eventualmente na vida todo mundo tem o seu despertar. O momento em que você olha para o seu amor e percebe que talvez seja ela aquela destinada a ficar, ou que talvez ele precise partir para dar lugar a alguém que realmente te entenda. Ou a sensação de que este lugar foi muito produtivo por um tempo, mas que o sucesso não depende de uma fórmula muito coesa e às vezes é preciso se perder para se encontrar, ou recuar antes de seguir em frente. Quanto a mim, eu decidi que a minha carreira precisava primeiramente de um foco. Como uma das minhas professoras me desejou pouco antes da nossa cerimônia de formatura; “Desejo para cada um de vocês um caminho e que vocês entendam como poderão trilhá-lo”. E apesar de ter mudado de CEP, minhas inseguranças permaneceram comigo até aquele exato momento. O momento em que a vida lá fora me acordou e eu decidi que precisava fazer isto valer a pena.

Alguns dias depois eu dei uma pesquisada e não encontrei nenhum registro daquele acidente. Nem em jornais impressos ou virtuais, mas de alguma maneira foi algo marcante para mim. Talvez assim como nem todas as histórias se tornem manchetes, nem todas as pessoas acertem seu caminho na primeira tentativa. É preciso continuar investigando, questionando e imaginando o que mais poderá haver em mim para encontrar meu lugar neste mundo. E eu decidi que o meu lugar seria em uma redação de jornal, trabalhando ao máximo para que histórias como esta pudessem ser contadas. Seria o inicio de outra longa jornada, mas só de me sentir um pouco mais seguro pela primeira vez em muito tempo sobre aonde eu quero chegar, já ajuda a me sentir um pouco menos perdido.

Algumas horas depois o guincho removeu a van da rua e a viatura retirou a barreira para que os carros pudessem passar. O caminho estava livre novamente e aquela família, menos assustada e mais atenta, seguiu em frente de novo. E eles não foram os únicos.

terça-feira, 4 de agosto de 2015

Os primeiros estágios de...


Saudade. É o primeiro sintoma de toda mudança de vida. Como via de regra a vida se transforma constantemente, mas como todo pessimista de carteirinha sabe, isso não significa necessariamente que as coisas melhoram. Esta é a questão que eu carrego ultimamente, especialmente considerando os meus próprios laços com o mundo além da terra das Cataratas. Não que eu seja um pessimista de carteirinha, porque “esperança” provavelmente se classificaria entre as dez palavras que mais uso em toda e qualquer dissertação argumentativa que eu já fui capaz de produzir, mas talvez não seja isso o que implica a crença ou descrença de alguém perante as coisas. Não. Talvez tenha mais a ver com a importância que a gente dá para os nossos fragmentos, independente deles serem reais ou não.

Não me lembro se foi Saint-Exupéry quem me ensinou sobre a vulgaridade das coisas, até que se decida que elas deixarão de ter tal natureza para se tornarem algo único. Ou foi ele, ou foi a minha mãe quem sempre repetia que é importante dar valor para o que se tem – o que, por sua vez, justifique a minha incessante mania de supervalorizar a proporção dos meus problemas. Enfim, nada disso importa muito agora. O que importa mesmo é a maneira que eu ando tratando as fotos antigas salvas no meu celular, os textos antigos no arquivo do meu computador, e o tempo verbal que passou a dominar as minhas conversas com meus amigos e familiares: como um tenso passado.

Era de se esperar que as minhas interrogações encontrassem um jeito de se infiltrar nas dúzias de caixas que empacotei para trazer a minha vida até aqui, mas eu ainda me peguei desprevenido perante o mundo novo e o antigo. Entre uma das cidades mais famosas do país em termos de cultura, lazer e turismo, com outros países a vista nas placas (dependendo da via rápida que você pega para chegar ao centro), e outra bem menos conhecida, localizada mais ao interior do Oeste e, ironicamente ao meu ver, no coração do Paraná. Mas irônico mesmo era me sentir bem mais confortável em um lugar incomum, do que um pouco deslocado entre os moradores, os turistas e os estrangeiros que passam por mim quando tento sair para explorar um pouco mais o meu novo plano de fundo. Houve um tempo, mais adolescente e apocalíptico da minha personalidade, em que eu costumava descrever esta sensação como estar perdido em uma multidão. Mas isso nunca foi tão sincero quanto a primeira vez em que perambulei pelas ruas da Avenida República Argentina sozinho. Mais irônico ainda foi pensar que mesmo se eu tentasse pedir uma direção para alguém, seriam grandes as chances de eu me deparar com um gringo que não entende português.

Enfim, a saudade é inevitável, mas é o primeiro estágio rumo a qualquer coisa nova que eu queira descobrir por aqui. Se toda e qualquer mudança tem suas fases, assim como um luto deve ser aceito, sentir-se deslocado por enquanto é o prelúdio da adaptação. Afinal de contas, já aprendi os nomes de algumas das principais ruas, o caminho para o terminal, a rodoviária, o mercado mais próximo, o zoológico e – claro – o shopping. É só uma questão de tempo para que eu saia para caminhar distraído e acabe cruzando uma fronteira. Apesar de desorientado, é reconfortante saber que para onde quer que eu vá daqui, minhas inseguranças ao menos serão internacionais.

É como dizem os avisos nos espelhos retrovisores dos carros: as imagens refletidas estão mais próximas do que parecem. Talvez eu devesse ter olhado para trás uma última vez antes de seguir em frente.