Das seis da manhã à meia-noite, com raras exceções. Tem dias em que consigo me refugiar
em devaneios menos preocupantes, e noites que quase não tenho meu sono
interrompido por algum medo do futuro. Mas quando a rotina não falha, este é o
horário em que eu vivo ultimamente; das seis da manhã à meia noite. E entre
trabalhar, namorar, estudar, ser parte de uma família, beber com os amigos e evitar
ter um completo colapso nervoso, tenho que ser sincero: sobra preocupação,
ansiedade, medo... e falta tempo.
O que aconteceu?
***
Era tudo o que eu queria. A carreira, o amor, e um despertador
programado no meu celular para me despertar todas as manhãs. Para soar a
largada da corrida de mais um dia. Algo que, desde que cheguei a Foz do Iguaçu,
não era um aplicativo muito utilizado. Ainda faltava uma razão para acordar
cedo. Coisa que, infelizmente, ficou para trás durante a mudança.
Mas foi exatamente por isso que me mudei. As razões pelas quais eu
levantava da minha cama de manhã, naquela vida, não me satisfaziam mais. E era
uma vida bem parecida com esta, se não fosse pela sensação inquietante de que
algo estava faltando...
Faltava estar feliz.
Talvez fosse por isso que eu passei tanto tempo daquela vida, escrevendo
sobre o amanhã. Sobre os erros que eu não queria mais cometer, os lugares que
eu queria conhecer, o amor que eu queria viver... Tudo parecia estar tão
distante. Tão longe da minha realidade. Até o dia em que eu decidi realmente ir
à luta por tudo que eu pensava que queria, e que não estava ao meu alcance. E
nada é mais aterrorizante, desconcertante, angustiante e maravilhoso, do que
finalmente criar coragem o suficiente para tentar alcançar a vida que você quer
ter.
Demorou um ano. Com inúmeras frustrações, desabafos, decepções e pessoas
erradas, mas eu consegui. Eu finalmente faço parte de Foz de Iguaçu, completo
com motivos para acordar e dormir cedo.
Por que eu não me sinto feliz então?
***
Nós temos essa mania incessante de sempre querer mais do que podemos
ter. A psicologia nos define como seres incompletos, em constante movimento, e
talvez isso explique este instinto de estar sempre à procura de algo a mais.
Mas até que ponto a ambição pelo amanhã supera a harmonia de hoje?
Nós pensamos que queremos algo, e nos focamos nisso até conseguirmos. Às
vezes o que queremos não é o que precisamos, e raramente as consequências disso
passam pela nossa cabeça. Particularmente, eu costumava pensar que todo o tempo
que passei escrevendo sobre o amanhã, foi por esperança. Não porque estava necessariamente
desesperado por dias melhores, mas porque havia algo de bom em fantasiar sobre
o que mais estaria por vir no dia seguinte. Como a inquietação de um leitor
frenético, que não vê a hora de virar mais uma página para descobrir qual rumo
a história que está lendo irá tomar. Na vida é parecido, mas nós somos os
escritores. A ansiedade está em descobrir quais possibilidades estarão ao nosso
alcance na próxima vez que chegarmos ao escritório, ou quando revermos os
nossos amigos, ou quando abraçarmos o nosso amor. O mistério do novo. A sombra
do desconhecido...
***
Ou talvez o único motivo pelo qual eu não consiga mais vislumbrar tanto
a magia e o encanto do amanhã, é porque ainda estou tentando me acostumar a
acordar cedo de novo. E ninguém pensa direito quando está com o sono atrasado. Seja
lá o que for, eu só precisava mesmo escrever alguma coisa. Assim como a vida, o
importante não é o desfecho, mas as histórias que a gente cria.
E se você tiver sorte, poderá tentar de novo amanhã.