domingo, 21 de agosto de 2016

Os embargos de sábado à noite


Até que ponto eu estou sozinho por opção?

Depois de mais uma semana corrida de trabalho, faculdade, e outros imprevistos de percurso, posso ficar tranquilamente em casa durante um sábado à noite, fixado em uma maratona de Netflix com acompanhamento de pizza e cerveja. Só descansando, recuperando o fôlego antes que mais uma manhã de segunda-feira chegue... E por pouco não me esqueço totalmente de que sequer existem Facebook, WhatsApp ou até mesmo outras pessoas. Não significa que estou sozinho no mundo – tenho meus amigos por aí, mas estão provavelmente na mesma situação que eu. Desfalcados financeiramente o suficiente para não pensarem em sair para lado algum, e existencialmente entediados o suficiente para não considerarem alternativas mais sustentáveis, como juntar a galera para que fiquemos todos desfalcados e entediados juntos em um lugar só.
É só um sábado à noite em casa; está tudo bem.

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Quer dizer... É mais um sábado à noite em casa. Quantos sábados à noite eu já tive que seguiram este padrão? Aliás, já é o bastante pra constituir um padrão? Não, esquece. Se concentre no que está assistindo: o oitavo episódio consecutivo da mesma série. Mas está difícil me acomodar; esses travesseiros não param no lugar. E a cama parece pequena demais. O monitor do computador está longe demais. O som está muito baixo. Tudo parece tão incômodo... Mas o que mais se pode fazer? Com esse tempo feio lá fora – não vai parar de chover tão cedo. Não teria mais o que fazer, nem se eu quisesse. Nem se eu tentasse... Não é?

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Estou cansado. Incomodado. Inquieto. Tudo bem que não dá pra sair. Os motivos são vários: financeiro, emocional, climático... Mas talvez conversar com alguém sossegue essa sensação. Conversar sobre qualquer coisa... Mas não com qualquer pessoa. O que será que a Fulana anda fazendo? Há quanto tempo não nos falamos? Não, esquece; é sábado à noite! Com certeza ela deve ter saído. Juntou os amigos e foram para algum lugar, beber e dar risada. Mas ela poderia ter me chamado, não é?
Não... Ela sabe que eu não iria.

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E o Ciclano? Que sempre me enche o saco para combinarmos algo. Toda semana é a mesma coisa, “No sábado vamos fazer alguma coisa na sua casa, viu?” Ok, pode vir. Chama os outros e vamos inventar algo. Um filme, um jogo, uma sessão incessante de conversa fiada, bobagens e piadas infames. Qualquer coisa. Mas não era nesse final de semana que ele ia viajar? Não me lembro. Deve ser; ele nem deu sinal de vida. Bom, e nem eu mandei nada. Será que ele ficou esperando?
Não, ele deve ter viajado mesmo. Fica pra próxima.

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O que será que Ela está fazendo? Eu não sinto a falta dela, mas fico aqui imaginando... Será que está em casa também? Não posso mandar uma mensagem inocente que seja, pois as entrelinhas acidentais falariam por mim. Eu não sinto a sua falta. Só estava aqui deitado, pensando... Não faz tanto tempo que, em uma noite como esta, provavelmente estaríamos juntos. Senão na mesma cama, ao menos por mensagens. Impedindo que o outro se sentisse sozinho. Falando sobre nada, sobre o que estivesse fazendo... Sobre este seriado que terá outro episódio começando em 15 segundos, 14, 13... Ou sobre o que ela está usando... Ou, o que gostaria de estar fazendo. A cama não parece mais tão pequena. Parece grande demais agora. Quem sabe seja só coisa da minha cabeça; ela não vai achar que há algo subentendido em um “olá”. Ou vai?
Melhor não arriscar. Não é tão ruim estar sozinho... Eu acho.

***

Acabou a cerveja. Talvez teria sido bom dar uma saída. Conhecer algum lugar novo. Tomar algo diferente. Descontrair. Quem sabe até encontrar alguém nova. E descobrir aos poucos de onde ela veio, do que gosta, no que acredita... Nada como a primeira vez em que a sua mão toca a dela, indicando que a conversa está boa. Ou então, quando a mão dela toca a sua, demonstrando que ela quer que você se aproxime. A primeira vez em que vocês olham nos olhos um do outro. A conversa desacelera. O coração dispara. O fôlego é interrompido. E vocês sentem os lábios se tocarem, devagar e incerto. Curioso e inseguro. Até se tornar rápido e insaciável em questão de instantes. E vocês param por um segundo para reverem seus olhares, e concordam com um sorriso que valeu a pena trocar a rotina pela interrogação da vida lá fora. “Que bom que eu saí de casa hoje e encontrei você...” que aos poucos se torna “Não quero que esta noite termine...
É, seria bom encontrar alguém nova. Só não sei se estou pronto. Ou sequer se me lembro de como fazer isso. Semana que vem, quem sabe. É. Sábado que vem.
Se eu não estiver muito cansado...

Por hoje, chega. Boa noite.