Existem várias teorias sobre o
Universo. Há quem diga que está em constante expansão, assim como há quem diga
que ele irá se autodestruir eventualmente. No final das contas tudo se resume
ao otimismo ou ao pessimismo com o qual você encara a vida que tenta viver
dentro dele. Particularmente falando, só há uma certeza sobre o Universo na
qual eu realmente consigo me apoiar: seja lá qual será o seu fim, seus meios
definitivamente não são sutis. E antes que você venha me perguntar sobre o que
me deixou tão filosófico desta vez, não foi nada grandioso como uma chuva de
meteoros ou místico como um eclipse lunar. Foi uma frase escrita na parte de
trás de um caminhão: “Tudo muda”.
***
Eu ando tão afundado na minha rotina que sempre me surpreendo
quando redescubro o resto do mundo que existe ao meu redor. Claro que às vezes
o movimento que me tira da inércia nem sempre é benéfico: é na rotina que
brotam alguns dos sentimentos mais tóxicos para um ser humano, como a fadiga, a
paranoia e a solidão. Ou você quer tentar me convencer de que o motivo pelo
qual você foi atrás de visitar o perfil do Facebook
daquela pessoa em particular era puro e inocente? Não se faça de desentendido;
você sabe do que eu estou falando.
E até aí,
tudo bem. Confesso que eu estava me sentindo um pouco esquecido, quando decidi
revisitar as teclas do teclado que juntas escreviam aquele nome que minha boca
não mencionava há tempos. Uma das garotas com quem saí este ano, em minha
tentativa de ser mais proativo sobre minha vida pessoal, mas cuja empreitada
tem se tornado cada vez mais desafiadora a cada nova decepção. Neste caso, foi
um encontro incrível – daqueles que faz você perder a noção da hora, de todos
que passam por vocês e sua conversa interminável, e de como você pôde viver até
então sem conhecer aquela pessoa. Eu realmente gostei dela; tanto que fiquei
extremamente nervoso só de pensar em tentar dar aquele passo adiante em nosso
encontro. Aquele momento definitivo que pode nos inspirar a marcar um segundo
encontro, ou a deletar o contato da nossa agenda para sempre: o primeiro beijo.
Eu não tive coragem, mesmo que já estivéssemos caminhando de mãos dadas pelas
ruas da cidade, sem nos importar com qual rumo nós iríamos tomar porque o
seguiríamos juntos.
Mas eu não o
fiz. E com o passar dos dias, aquelas conversas intermináveis acabaram por se
esgotar, e a data para um segundo encontro nunca foi marcada. Até onde eu pude
concluir, e pelo pouco que conheci sobre ela, ela imaginou que eu não estava
interessado o bastante. E não havia tempo a perder; ela queria algo sério. Algo
que ela decidiu que não encontraria em mim. Eu não tenho sentimentos
remanescentes sobre aquela noite, mas guardei comigo a lição de que se duas
pessoas decidem arriscar deixarem suas zonas de conforto de lado para se
conhecerem, o mínimo que você pode fazer é que a experiência valha a pena – e isto
inclui o beijo que ambos saíram de casa imaginando em dar, mas sem saber
exatamente como chegar até ele.
Já se
passaram meses desde aquele encontro, mas a lição continua comigo. Tanto é que
me peguei reescrevendo seu nome para visitar o mural virtual que ela mantém
sobre os acontecimentos mais recentes da sua vida. A tragédia de todo “stalker” é invariavelmente descobrir que
o que ele mais teme é verdade: ela estava decididamente mais feliz do que
jamais estaria caso tivesse ficado comigo. Mais do que envolvida em um novo
relacionamento, ela já estava prestes a começar sua própria família.
***
Dia desses
eu estava passando por uma outra rua da cidade que há tempos evitava. Porque
nela ficava uma empresa na qual eu fiz não uma nem duas, mas quase uma semana
de entrevistas e treinamento para tentar ser selecionado para uma vaga que
parecia ser boa demais para ser verdade. Horários flexíveis, salário modesto,
uma adição espetacular ao meu currículo, tudo muito impecável e com potencial
de fazer a minha vinda para Foz do Iguaçu enfim valer a pena. Porque seria com
aquele salário que eu bancaria o meu sonho de retomar os estudos para me tornar
um jornalista.
Mas como é
de se esperar da vida, toda expectativa do mundo jamais será recompensada.
Muito pelo contrário; mais vezes do que outras, o pior acontece. Eu não fui selecionado.
Mesmo depois de abrir mão de várias oportunidades em nome daquela, mesmo acreditando
que tudo já estava praticamente acertado para o meu recomeço profissional, e
mesmo que eu já tivesse cometido o erro de deixar o meu sonho depender de algo
que ainda era incerto. Não fui escolhido. E só o baque de ver o meu sonho se
perder foi o bastante para me deixar de cama por alguns dias. Isto é, até ser
salvo pelos meus pais, que fariam o possível por mim enquanto eu ainda não
conseguisse me sustentar sozinho.
***
O motivo
pelo qual eu estou revisitando esses episódios, que aconteceram bem cedo em
2016, é porque quando ambos acabaram por me decepcionar, eu sinceramente
acreditei que o restante do meu ano já estava perdido. Duas semanas após os
brindes de frisante, os votos de saúde, alegria e as promessas para um ano
melhor, eu já estava recluso em um quarto escuro e fechado, contando os dias
para 2017. Tentar novamente parecia inimaginável. Acreditar que poderia dar
certo parecia impossível.
Só que um
dia desses, rodando a cidade por caminhos que há tempos eu não trilhava, acabei
por reencontrar meus traumas de maneiras mais inesperadas do que eu sequer
podia imaginar. Ao passar pelo lugar onde havia encontrado aquela garota pela
última vez, decidi enfrentar meus medos e dar aquela espiada online para ver se
ela estava mesmo tão feliz quanto parecia. E talvez ela esteja – certamente é o
que eu desejo a ela – mas depois de meses acreditando que ainda havia algo
dormente em mim sobre isto, eu descobri: não há. Ela foi a primeira garota a
segurar a minha mão na sua, depois de meses que passei tentando estabelecer o
meu lugar em Foz do Iguaçu. E no final das contas, eu o encontrei: só não era
ao lado dela. E como se não fosse o bastante, acabei passando pela rua daquela
empresa que me prometeu que também haveria um lugar para mim ali, só para levar
o susto de ver que sua fachada havia sumido. Sem nenhum aviso de mudança de endereço
ou coisa parecida; somente a placa de “aluga-se” para quem estivesse
interessado no imóvel.
Acontece.
Encontros podem ser incríveis, mas também podem ser experiências únicas.
Entrevistas podem ser promissoras, mas também podem acabar ecoando na
incerteza. E enquanto nós continuamos vivendo sob as noções do que poderia ter
sido, nas oportunidades que perdemos, e aparentemente perdidos sobre qual rumo
seguir agora, eis que surge o Universo e sua sabedoria infinita na forma mais
inesperada possível: através de um caminhão que surgiu na minha frente no
trânsito, enquanto eu viajava rumo à Cascavel por uma tarde para resolver
assuntos inacabados, antes de retornar para Foz do Iguaçu onde minha vida nova
e meus compromissos estavam a minha espera. E escrito em uma das suas portas traseiras,
estava a inegável verdade: “Tudo muda”.
Eu comecei
2016 cheio de planos. Planos que se desfizeram mais rapidamente do que as
decorações de Natal que ainda estampavam a cidade. E por um instante eu pensei
que tudo estivesse perdido. E por alguns meses ainda acreditei que não haveria
como retomar o meu rumo para este ano. E quando eu menos esperava, tudo mudou.
Outras pessoas surgiram, assim como novas oportunidades. Ambas, inclusive, que
me trouxeram ainda mais próximo do meu sonho – hoje uma realidade muito feliz
em minha rotina diária. Mas eu não sabia de nada disso, e como poderia? O que
só me faz pensar que não importa no que eu acredite, ou o quão perdido eu me
sinta, nenhum de nós sabe o que está reservado para nós rumo à estrada adiante.
Só o que podemos fazer é continuar seguindo em frente.
Felizmente, a
falta de sutileza do Universo é o que nos salva todas as vezes. Basta você
prestar atenção nos sinais.