Alguns meses atrás, eu me peguei
pensando e escrevendo sobre fronteiras. Algo corriqueiro em se tratando de uma
cidade como Foz de Iguaçu, completa com saídas de emergência para não um, mas
dois países à sua escolha, caso opte por fugir da nossa atual decadência
geopolítica. E ao considerar o significado de fronteiras além das definições
geográficas usuais, pensei sobre aquelas que eu ainda não me sentia capaz de
atravessar. Sempre penso em Foz do Iguaçu como um centro de possibilidades mais
amplo e internacional do que qualquer outro em que eu já vivi. Meu problema estava
em descobrir exatamente o que fazer com elas.
A melhor – e
talvez, a única – estratégia que bolei para mim foi, primeiramente, sair por aí
e conhecer pelo menos o que havia ao redor da minha casa. Uma rua paralela
aqui, uma avenida principal ali. Padarias ridiculamente extorsivas, academias
que nunca freqüentarei, um bar de arguile
que misteriosamente nunca parecia ter clientes. Hotéis, hostels e sacolões de
hortifruti. Entre estabelecimentos de serviço e restaurantes estrangeiros, só
de conhecer um pouco o meu próprio bairro já me ajudou a reconstituir meu senso
de segurança. Algo que, por via de regra, é a primeira coisa a ser quebrada em
toda mudança – seguido, invariavelmente, de copos e pratos mal embalados.
Sabendo por
onde andar, restava encontrar uma finalidade para essas ruas. Alguém para
marcar um encontro por aí, ou para simplesmente andarmos sem rumo avenida afora
até a primeira curva que surgisse no nosso caminho. E por um tempo eu tive
encontros (alguns bons, outros esquecíveis), conheci pessoas diferentes e aprendi
a dar orientação para ajudar turistas a chegarem até o terminal de ônibus. Mas
a sensação de que eu ainda era um deles permanecia comigo a cada parada. Mudar
de um ponto A para o B é fácil, mas e quanto a pertencer a este lugar?
De vez em
quando eu ainda me sinto um estrangeiro, tentando sobreviver entre os
estabelecidos que nasceram aqui ou apenas chegaram antes de mim. Mas aí tem
vezes em que eu me surpreendo quando me pego dando direções à estas mesmas
pessoas. Como assim você mora aqui e nunca visitou o Templo Budista? Como assim
você não sabe qual ônibus leva até o centro de visitantes das Cataratas? Como
assim você não sabe aonde fica o terminal?!
A verdade é
que estamos todos perdidos, em busca de algo ou alguém que nos oriente. Por
anos eu fiz amizades que serviram de guias turísticos para me ajudarem a
desbravar os admiráveis mundos novos que existiam dentro da nossa própria
cidade. Fronteiras que, por algum motivo, não nos era interessante atravessar
antes. E eu entendo isso agora. Algumas fronteiras simplesmente não foram
feitas para serem atravessadas sozinho. Há quem diga, inclusive, que tal
travessia solitária – em se tratando de relacionamentos – é impossível. Por que
não, então, parar e pedir informação? Ou quem sabe, ter um pouco mais de
iniciativa em se tratando do mundo além do seu próprio bairro – ou do seu
próprio umbigo.
Eu fico
constantemente maravilhado com as coisas e as pessoas que descubro por aí. Assim
como fico feliz em compartilhar o meu mundo com aqueles que se interessem por
anotar o meu endereço, e por vir conhecer um pouco mais sobre mim do que apenas
o meu nome. Ou a minha fama de comentários sarcásticos infames que parece
sempre me preceder. Há um mundo enorme lá fora, é verdade. Mas às vezes ele nem
se compara ao universo que existe ao nosso lado, e a gente nem desconfia.
Talvez em uma rua pela qual você nunca andou antes, ou talvez em alguém que
você nunca cumprimentou.
Às vezes
parece mais fácil esperar em uma fila para cruzar uma “aduana” do que tentar conhecer alguém novo. Ironicamente, a
burocracia envolvida é a mesma.